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segunda-feira, 30 de julho de 2012

Belas Maldições, Neil Gaiman & Terry Pratchett



Belas Maldições
Neil Gaiman e Terry Pratchett


O que acontece quando se junta um autor invariavelmente famoso e adorado com outro, invariavelmente desconhecido e venerado?

Um livro invariavelmente muito engraçado.

Não do tipo que te faz gargalhar histericamente de vez em quando, mas daquele que você lê com  um sorriso nos lábios do início ao fim e que volta e meia faz com que se receba olhares tortos de pessoas próximas que assistem a disputa do bronze do tiro com arco. (A Coréia do Sul (?) ganhou, caso alguém se interesse, apesar de eu estar torcendo bastante para o carinha de óculos do México.)

Bem, eu estou falando de Belas Maldições escrito por Neil Gaiman (o famoso) e Terry Pratchett (o desconhecido).


Os Autores.

O Neil é responsável por livros como Stardust, Deuses Americanos, Coraline e pela HQ Sandman e – apesar da minha recente implicância com ele por causa das postagens e propagandas sem-graça que ele feito no blog dele– ele sabe, não só escrever bem um livro, mas como criar uma história. (O meu favorito é Stardust!)

O Sir Terry Pratchett é um daqueles autores absurdamente famosos. Mas muito famosos mesmo. (Negrito e itálico, isso que é enfatizar.) Mas que você nunca ouviu falar dele na sua vida inteira, até que aconteceu. Seus livros se passam basicamente em um único universo, o Discworld, o que pode parecer falta de criatividade. Mas eu digo com toda a minha experiência de apenas um livro dele lido, o que não falta nesse homem é criatividade.


A Sinopse (ou coisas bem-boladas e estrategicamente pensadas para chamar a sua atenção e te fazer ler esse livro sem parecer tudo muito intimidante).

O Apocalipse está prestes a acontecer, o Anticristo – a criatura mais poderosa da Terra e alguém extremamente preocupado com o meio ambiente – está prestes a se manifestar e um anjo e um demônio não gostam nem um pouco do que isso tudo está prestes resultar.

Aziraphale o anjo e Crowley o demônio gostam muito deste mundo, aqui eles se sentem confortáveis e já estão bastante acostumados e, por isso, decidem juntos impedir que toda essa história desnecessária de guerra entre o céu e o inferno e, consequentemente, o fim do mundo aconteça conforme planejado pelos seus Superiores (um caso de insubordinação bíblica), e, para isso, precisam lidar com a série de inconveniências que aparecem com o tempo como caçadores de bruxas, bruxas, precipitações climáticas envolvendo peixes e.. lagostas, desmaterializações e, claro, a maneira como qualquer cd que permaneça dentro do carro por mais de três dias insiste em se transformar em um cd dessa banda inglesa bem famosa. Além, claro, de matar o Anticristo.  E precisam fazer tudo isso até – como descrito no livro “As Belas e Precisas Profecias de Agnes Nutter, Bruxa” ­– sábado. O próximo sábado.

E claro. Há um grande mal-entendido.


A Opinião.

Eu nunca gostei particularmente de histórias envolvendo anjos, demônios ou nada remotamente religioso. Mas Belas Maldições vale muito a pena. É um livro incrivelmente engraçado, com aquele humor que lembra O Guia do Mochileiro das Galáxias, um humor bem britânico. Cheio de ironias e referências a todas essas maluquices do mundo moderno, a cultura pop e incoerências bastante humanas.

Como na história um anjo e um demônio se juntam para impedir o Apocalipse e manter o mundo do jeito que ele é, há uma série de embates morais entre eles, te fazendo pensar no que seria o bem e o mal, na necessidade do Apocalipse e toda essa guerra entre o Bem e o Mal. Sobre o que esse plano inefável seria realmente.

Tendo lido livros dos dois autores, eu consigo ver em todo o livro um pouco do estilo de cada um e, ao mesmo tempo, ambos estão tão bem costurados que não dá para dizer que parte um ou outro escreveu, o que eu acho incrível (Enfatizar! Enfatizar!).  E queria muito saber como foi que eles começaram isso tudo. Eles pensaram na história toda antes de sentar para escrever ou o destino dos personagens veio conforme as letrinhas apareceram?

Acima (ou abaixo, dependendo do referencial) de tudo, o que eu mais gostei foi a maneira como o livro foi escrito. Eu adoro digressões. Sou uma fã incondicional de digressões. Eu poderia ser presidente do partido dos utilizadores de digressões em obras literárias (PUDOL, nosso símbolo é uma flecha com enfeites mexicanos – sim, eu estava realmente torcendo para ele – e estaremos concorrendo para a secretaria legislativa da ABL em 2017, contamos com seu apoio).

 Afinal, quem precisa de uma linha contínua de idéias? Informações aleatórias sobre fatos aleatórios é o que há de melhor!

Enfim, é um livro muito bom que trata de temas um tanto quanto delicados, mas consegue fazer isso com personalidade, humor, ironia e delicadeza. Sem ofender ninguém.


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aqui tem um link para uma pequena lista de resoluções de fim de ano do Crowey e do Aziraphale escrito pelos autores. Bem legal.

E pesquisando no Dicionário inFormal, descobri que inefável significa “...[aquilo] que não pode ser expresso verbalmente. Algo de origem divina, dotado de tantos atributos de perfeição e beleza, que transcende os limites da linguagem humana.” Isso pode ser útil para alguém, algum dia.


terça-feira, 24 de julho de 2012

O Temor do Sábio - Patrick Rothfuss

 
Detalhes do livro:
Nome original: The Wise Man's Fear.           
Tradução: O Temor do Sábio.
Autor: Patrick Rothfuss. 
Lançamento: Original: 2011. (Março)
                       Em português: 2011.  (Novembro)
Páginas: Versão "Hardcover" original: 994.
                Versão em português: 960.   



[ATENÇÃO: ESTA “RESENHA” CONTÉM PEQUENOS SPOILERS, COMO NOMES DE PERSONAGENS E ALGUNS ACONTECIMENTOS FUTUROS NA TRAMA.]
 
“O Temor do Sábio”, segundo livro das crônicas do Matador do Rei (por que não Regicida?), continuação direta de “O Nome do Vento”, livro da minha resenha anterior.
Antes de começar os pormenores, acho cabível dizer que achei “O Temor do Sábio” uma leitura inferior comparado ao seu antecessor.  O que não quer dizer que não houve melhorias do primeiro para o segundo, só que os fatores que pioraram com certeza são mais expressivos.
O Sr. Rothfuss parece ter retroativamente ouvido algumas das minhas reclamações e fez mudanças de acordo como, por exemplo, a caracterização, ponto que frisei bastante na última resenha. Os personagens do ambiente da Universidade estão um pouquinho mais complexos e profundos. Talvez pela sua simples aparição e permanência do livro, dando-lhes situações diferentes para que possam reagir e para os leitores absorverem um poucos mais de suas personalidades. Aquele grande resumo da última resenha ainda se aplica, e aquelas características ainda descrevem os personagens com razoável margem de segurança, mas não é mais aquele festival de uni-dimensionalidade de antes. Caso eu tampe o nome dos personagens e leia seus diálogos, talvez agora consiga reconhecer quem fala o quê sem ter que recorrer a seus estereótipos.
Essa melhora na caracterização nos é recompensada com eles sendo retirados da trama da segunda metade do livro, quando Kvoethe larga a Universidade por alguns períodos para andar pelo mundo devido a desavenças com seu rival, Ambrose.
Os novos personagens novamente não se mostram tão simples quanto os do livro anterior pareceram, mas o processo de torna cansativo. Talvez meu maior problema com o livro seja esse. O processo. É difícil explicar. O livro é como se fosse uma grande série televisiva com seus inúmeros episódios. Existem aqueles episódios importantes pra trama e pro MythArc em geral e tem aqueles que são aventuras avulsas. O livro, principalmente sua segunda metade, parece uma grande coletânea desse segundo tipo de episódios. Kvoethe faz algo legal ali, faz mais algo acolá. Kvoethe conhece personagens novos, tem aventuras com eles por cerca de 100 páginas e depois eles não aparecem mais e ele vai pra outra região do mapa com novos personagens e novas aventuras. Nenhum desses personagens tem tempo razoável para sua caracterização e duvido que todos eles terão importância futura.
O problema principal é que são esses seus feitos avulsos os de maior importância no livro. Sim, não vou negar que tem algo importante ali no meio, sem querer dar muitos spoilers, o encontro com Feluriana parece que terá repercussões. Mas da grande Badass Boast que Kvoethe dá no começo de O Nome do Vento, só presenciamos até agora, um ou dois feitos relevantes (sendo o encontro com Feluriana um desses.).  O que me deixa apreensivo para o próximo livro, ele pode acabar contrastando demais com a pacing do resto da trilogia.
O fato de “nada acontecer” é o erro mais gritante de pacing. Lemos quase mil páginas e não tem nenhum prêmio no fim do caminho. Novamente não há antagonista palpável, apesar do livro introduzir mais um deles, na forma de Cthaeh. A premissa até é interessante, é um ser selado em uma árvore que vive no mundo dos Encantados (quase Exdeath) e pode ver o futuro. Não se preocupem, estou guardando os detalhes mais relevantes, porém tomem nota que o personagem não é explorado, assim como todos os outros antigos antagonistas.
Ambrose, rival do protagonista, cresce no status de rival ao começar a cortejar Denna, amada de Kvoethe. Entratanto, ele desaparece na metade do livro devido ao afastamento de Kvoethe da Universidade.
O Chandriano é mencionado em conversas entre personagens, é conseguida um pouco mais de informações sobre eles, porém sua real presença é reduzida a um cameo. Então, temos dois antagonistas (sendo um deles um grupo de 7 pessoas) pouco trabalhados e outro recém-introduzido na história sem nenhuma previsão de resolução, casa haja uma. Ou, na falta de resolução, pelo menos o andamento do plot.
Temos um melhor insight na arte da Nomeação agora que Kvoethe encontra-se sob a tutela de Elodin, o excêntrico professor e Nomeador-mor. Ainda não cheguei a uma conclusão se o Sr. Rothfuss às vezes força demais a barra para tornar Elodin o típico professor louco-porém-genial.
            O fato de Kvoethe resolver andar pelo mundo na segunda metade do livro pareceu uma boa oportunidade de apresentar um pouco de diversidade nos Quatro Cantos, entretanto o que encontrei foi exatamente o contrário, literalmente. Já chego lá.
Suas primeiras andanças são devido a procura por um mecenas e chega em Vintas para se apresentar ao Maer, líder da região. Temos o mesmo joguinho político já tão aludido e presente no setting da Universidade com um ou outro fator diferente e é isso.
Temos o encontro com Feluriana, em que Kvoethe fica no mundo dos Encantados e aprende um pouco sobre eles e conversa com Cthaeh. O ar místico deste trecho do livro talvez seja a melhor passagem, já que contém elementos que são importantes pro plot principal.
Uma das viagens de Kvoethe, agora enviado pelo Maer para se livrar de alguns bandidos faz com que ele lidere um grupo de mercenários, um deles, um Ademriano. O que eventualmente leva o protagonista a conhecer esta cultura exótica.
Esse é o ponto em que minhas esperanças com o World-building do Sr. Rothfuss se esvaíram. Esta é a parte que quis dizer com ser “exatamente o contrário, literalmente”. E, ao mesmo tempo, é mais do mesmo. O povo Ademriano possui uma cultura extremamente diferente e interessante, a primeiro relance, até que me dei conta que ela parecia ser montada para ser o exato oposto do Kvoethe.
Kvoethe é um ótimo ator e encena bem, os Ademrianos acham sorrisos e expressões faciais de extrema intimidade e deve-se controlar tais impulsos e exibir seus sentimentos por gestos com as mãos. Kvoethe é músico,mas a música, para os Ademrianos é considerada mais íntima ainda e uma pessoa que toca para um público sem esconder seu rosto é considerado um prostituto.Kvoethe é um arcano poderoso, entretanto um guerreiro fraco. Os Ademrianos, por outro lado, são guerreiros natos e invencíveis num combate. Kvoethe era virgem até pouco antes de conhecê-los, tem problemas com mulheres, vive numa sociedade medieval extremamente machista. Os Ademrianos não tem taboos de nudez e sexo e vivem numa sociedade extremamente feminista.
E assim continua. Não é criativo. Se “O Temor do Sábio” é uma coletânea de episódios, o tempo nas terras de Ademre é o capítulo do dia do contra, do Bob Esponja. Quanto a parte de “ser mais do mesmo”, os Ademrianos são basicamente os elfos. Não estou dizendo quanto ao contato a natureza e orelhas pontudas, mas aquele sentimento que sempre paira em histórias envolvendo elfos, em que você não deve discutir comeles. Os Ademrianos são melhores em tudo, constroem casas sem formas padrão porque as deles complementam a natureza e são mais eficientes, seguem a Lethani, uma filosofia de vida que é tão complexa que uma de suas principais características é a impossibilidade de explicá-la, apesar de parecem um povo voltado ao treinamento como guerreiros, possuem tecnologias relativamente avançadas, são vítimas do que se resume ser uma diáspora e vivem em um dos piores pedaços de terra dos Quatro Cantos e ainda são prósperos. Consideram todos aqueles fora de sua cultura como “bárbaros”, o que não é problema, até o momento em que Kvoethe, o genial arcanista da Universidade, tem seus argumentos totalmente humilhados em qualquer discussão com eles. É frustrante.
Por fim, Kvoethe. Temos a versão ‘Kote’, do presente, que está contando a história. Um homem que está esperando a morte e que se diz ser a razão para a guerra que está acontecendo. A todo momento, o livro brinca com a ideia de ambuigidade moral do nosso protagonista. E, Kvoethe, o jovem aventureiro, com certeza flerta com essas ideias. Ele comete atos cruéis e totalmente psicóticos no dercorrer do livro, porém, sempre surge um fato, durante ou depois do acontecido, para atenuar sua culpa e não tirar nossa dúvida de que ele vive num mundo de moralidade cinza, mas com certeza é um cinza claro.
O que quero dizer é que não se toma nenhum risco com o personagem do Kvoethe. O eterno estado de pobreza em que se encontra é remediado, sua crueldade excessiva é descarregada em ladrões, impostores, assassinos, estupradores e que estão relacionados com o passado do protagonista. (Não estou falando de personagens avulsos e sim de personagens que são tudo isto ao mesmo tempo.). Isto não muda as atitudes do Kvoethe, porém com certeza força os leitores a se manterem do seu lado.
Por se tratar de um livro de aventuras que parecem avulsas, também não possui começo, meio e fim. É até engraçado, o final do livro trata-se do Kvoethe voltando ao que parece ser o plot principal da trilogia, deixando pra trás cerca de 500 páginas do que eu posso considerar ‘sidequests’.
Agora só resta a esperança que a pacing desregulada já montada pro último livro da trilogia (ainda sem nome) não seja suficiente e que a melhoria do Sr. Rothfuss em uma história coerente seja aproveitada para que essa série tenha um desfecho digno de fantasia épica, como tanto alardeiam.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Era Uma Vez, Há Muito Tempo Atrás, Brigid Pasulka



Era Uma Vez, Há Muito Tempo Atrás...
Brigid Pasulka

A primeira vez que ouvi falar desse livro foi em um dos milhares blogs de resenha que acompanho. E o que mais me deixou curiosa foi a mistura de conto de fadas com Polônia pré e pós guerra com a qual a história foi descrita.

São duas histórias intercaladas, é a história de uma família.

A princípio, o livro narra a história de Pombo e Anielica e de como se conheceram e se apaixonaram, todas as etapas do relacionamento, desde como Pombo cortejou o Anjo da Aldeia e como a invasão da Polônia pelas tropas alemães (o que daria início a 2ª Guerra Mundial) moldou suas vidas. Durante os primeiros capítulos, tem-se sempre a sensação de que os alemães vão chegar a qualquer momento e, então, quando o sofrimento vai chegar? É interessante como se tem vários livros que contam a história dos que foram diretamente atingidos, mas poucos sobre os que estavam sempre na expectativa de algo acontecer
.
E, logo em seguida, “começa” a história de Beata, neta de Pombo e Anielica, 50 anos depois. Beata, ao contrário dos avós, vive um momento de aparente tranqüilidade, tendo a Polônia se separado da URSS e adotado um sistema capitalista, ela tenta se adaptar a  sua nova vida em Cracóvia e, pouco a pouco, descobre a verdadeira Cracóvia por trás das história românticas contadas pela avó.


“Eu me pergunto quanta mudança somos capazes de aceitar na vida.”
p.335


Eu sempre tive muita curiosidade na maneira como um país como Polônia, Rússia, Alemanha, lidam com todas as guerras pelas quais passaram. Para mim, a II Guerra Mundial, a Guerra Fria... são apenas capítulos em um livro de história. Para eles, é algo que aconteceu a poucas décadas atrás. Ainda existem pessoas que passaram por todo o drama e o sofrimento daquela época, então, como lidar com isso?  E é isso o que mais me surpreende. Por causa da escolha das histórias, em um momento você está lendo sobre como foi a resistência polonesa à invasão alemã, a adaptação ao comunismo e, logo depois, como é sobreviver na Nova Polônia, como é ser jovem em um país cínico e desiludido, mas ao mesmo tempo batalhador

Achei um livro adorável, um conto de fadas de verdade... onde finais não são necessariamente felizes ou tristes.. ou sequer são finais. Uma história de solidariedade e de amor. Achei incrível como Brigid Pasulka levou a história dessas pessoas, submetidas ao trágico curso da história, de uma maneira tão suave. Do tipo que arranca lágrimas.


“Mas essa não é só uma história triste. É nosso passado. Sem isso, não temos nada.”
p.51



 P.S.: O tradutor poderia ter maneirado no uso de termos em polonês. Tentar lembrar o significado das palavras polonesas que você traduziu no Google Translate não é sempre divertido. :P






sexta-feira, 13 de julho de 2012

O Nome do Vento - Patrick Rothfuss

 
Detalhes do livro:
Nome original: The Name Of The Wind.
Tradução: O Nome do Vento.
Autor: Patrick Rothfuss.
Lançamento: Original: 2007.
                    Em português: 2009.
Páginas: Versão "Hardcover" original: 662.
              Versão em português: 656.
A capa acima trata-se da versão brasileira. As nos lados, capas alternativas da hardcover original em inglês.


[ATENÇÃO: ESTA “RESENHA” CONTÉM PEQUENOS SPOILERS, COMO NOMES DE PERSONAGENS E ALGUNS ACONTECIMENTOS FUTUROS NA TRAMA.]

Então, “O Nome do Vento”. Antes de tudo, alguns esclarecimentos: Quem me indicou esse livro, vigorosamente, foi a Mariana, co-autora deste blog. Procurei algumas opiniões na internet, superficialmente, e o que encontrei foi um coletivo ‘fangasmo’ por parte dos amantes de livros de fantasia. E até dos não-amantes de livros de fantasia. Aparentemente, o Sr. Patrick Rothfuss havia conseguido fazer sua estréia como autor com o pé direito. Não precisa dizer que peguei neste livro com as expectativas lá no alto.
            Isto talvez tenha sido a pior situação que poderia ter ocorrido. “O Nome do Vento” não é um mau livro, pelo contrário. Porém, não está nem perto daquela obra-prima da literatura para qual me preparei.
            “O Nome do Vento” começa com Kote, o ruivo e taciturno dono da hospedaria Marco do Percurso em uma pequena vila no meio do nada. A situação não está nada boa, há uma guerra ocorrendo, as estradas não estão seguras e temos monstros à solta. E, obviamente, ele e seu aprendiz, Bast, ajudante na hospedaria, sabem mais sobre os atuais acontecimentos do que deixam escapar para os outros moradores.
            Não muito tardar, um homem aparece na hospedaria, O Cronista, procurando Kvoethe (pronúncia “Quouth”.), personagem elevado a níveis mitológicos por seus feitos incríveis, sendo protagonista de diversas histórias de seus grandes feitos.
            Kote, o dono da hospedaria, é Kvoethe e, após algumas tentativas, é persuadido por Bast e pelo Cronista a recontar sua história. Ele necessitará de três dias para contá-la, cada um sendo um livro da trilogia e, pronto, temos aí a Framing Device para toda a série.
            Quanto à história de Kvoethe, ela pode ser dividida em três partes. Sua infância com a trupe de artistas dos seus pais, os Edena Ruh. Relatando seu primeiro contato com um Arcanista (um mago) e seus primeiros ensinamentos nestas artes, por meio das simpatias. Este período feliz é dramaticamente finalizado quando toda sua trupe, exceto si mesmo, é morta pelo Chandriano, organização misteriosa personagem de cantigas infantis, como um bicho-papão, que não possui padrão ou motivos conhecidos para seus ataques.
            Ao ser o único sobrevivente, Kvoethe vaga até a cidade de Tarbean, onde passa difíceis anos como mendigo, em situação animalizante.
            Por fim, a terceira parte trata sobre sua chegada a Universidade, que nos apresenta “o grosso” dos que parecem ser os personagens mais importantes da narrativa e a localidade central de onde se passará a história. Lá ele faz amigos, apaixona-se e inicia seu estudo formal de magia.
            Pode parecer que estou contando a trama toda, mas não se assustem, isso tudo está na sinopse. Por outro lado, estou sim contando tudo, porque até chegar na Universidade, um bom terço do livro já se passou.
            No geral, este foi meu maior problema com o livro. Ele é grande, mas só o número de páginas não faz um livro ser automaticamente bom, precisa de conteúdo. E tem horas com uma incrível escassez de qualquer coisa que pareça ser a história andando pra frente. Estão vendo o parágrafo que fala do “segundo ato” da história, da sua vida como mendigo? Eu fiz um bom resumo, vide que nada acontece.
            É extremamente interessante ler esta parte, a escrita do Sr. Rothfuss não deixa a desejar e fiquei sinceramente angustiado lendo os trechos mais tensos da vida de Kvoethe como mendigo. Mas, no geral, nada ocorreu, esta parte poderia ter sido mais rápida. Talvez tenha um ou dois acontecimentos importantes que ainda não foram utilizados e que o autor esteja guardando pra livros futuros, mas ainda assim...
            A infância de Kvoethe se passa com a perfeita trupe de artistas Edena Ruh, onde não há brigas, disputas e todos são felizes e com espírito aventureiro. No início, interpretei como um simples caso do Kvoethe sendo um Narrador Não-Confiável. Há um momento memorável em que Bast comenta que Denna, a amada de Kvoethe que ele conhece a caminho da universidade, não é tão bela ou perfeita como na descrição. Quanto aos Edena Ruh, em compensação, todos os outros personagens só sabem elogiar e falar de sua perfeição como artistas e boa gente. Ironicamente, nenhum personagem comenta com Kvoethe, quando ele os informa que era da trupe, que ela foi exterminada enquanto estava na estrada. Mais tarde, no livro, o Chandriano aniquila um casamento e, no mesmo dia, a 110 quilômetros de distância, já estão falando disso com Kvoethe.
            A sua chegada na Universidade marca um momento em que a história fica interessante, nem que seja pelo simples fato de que Kvoethe possui outros personagens para poder interagir. Logo ao chegar, já ganha uma reputação que podemos ver que ainda possui nos ‘tempos atuais’, ele consegue entrar com 15 anos na Universidade, feito não antes realizado.
            Vamos tirar logo uma coisa do caminho: A comparação inevitável da Universidade (de magia!) com a Escola de Magia, Hogwarts de um tal série chamada Harry Potter que alguns conhecem. Elas não possuem muitas semelhanças, além da setting de, bem, magia. O sistema é realmente parecido com de uma Universidade, sendo dividido em períodos, os alunos escolhendo que disciplinas cursar, se atrelando a um professor e trabalhando para ele, enfim.
            (Um breve comentário: Grande partes do reviewers morrendo de amores por esse livro me pareceram querer projetar sua tão amada série Harry Potter (Que, não se enganem, eu adoro.) nesta trilogia, chamando-a de “Harry Potter para adultos” e coisas do tipo.)
            O sistema de magias é interessantíssimo e uma das melhores partes do livro é ler sobre o funcionamento das simpatias, forma mais básica de magia utilizada por um Arcanista. Mas, diferente do que já vi dizerem por aí, o sistema de Nomeação, o que dá o nome a série, não é tão original quanto pensam. A Nomeação é o ramo de magia mais forte, onde, sabido o verdadeiro nome de alguma coisa, é permitido ao Nomeador o total controle sobre isto. Para citar apenas um (péssimo) exemplo deste sistema: Eragon. Infelizmente, toda exposition sobre o funcionamento de magia é de aulas que Kvoethe tem, ou que ele mesmo dá, tornando o processo um pouco repetitivo.
            Além da setting bem genérica, vamos aos personagens. Primeiramente, Kvoethe, como devem ter notado, é um gênio. Músico prodígio, Arcanista prodígio, Cientista prodígio. Em minha opinião, isso foi uma aposta que não vingou. Para contrabalancear, ele possui um defeito mortal, sua impaciência. De qualquer forma, ainda é um personagem fraco que, com todos seus atributos, consegue matar qualquer tipo de tensão dramática que possamos ter em algum momento. Ele vai conseguir resolver seus problemas em mais um plano genial ou demonstração grandiosa de poderes. Um ponto bom, ao menos, é que essa parece ser uma história de vingança. Kvoethe quer informações sobre o Chandriano que matou seus pais, mas não é fixado nisso e quer ajeitar sua vida primeiro, lutando contra sua eterna pobreza e se mantendo na Universidade. Ah, quase todas as mulheres que aparecem são jovens adultas que tem algum tipo de atração por ele também.
            De resto, os personagens são bem uni-dimensionais: Simmon é inocente e energético. Wilen é fechadão e gosta de beber. Denna é misteriosa (Para ser honesto com o Sr. Rothfuss, ele parece estar guardando algo pra ela.). Elodin é o típico mentor louco que futuramente com certeza vai se mostrar mais sábio e são do que parece, apenas extravagante. Ambrose, rival de Kvoethe, é só mais um elitista arrogante. Lorren é o bibliotecário que preza seus livros acima de tudo. Homme é o professor que não admite ver um aluno brilhante, Feila é peituda e por aí vai.
            Ainda nos personagens, minha maior decepção com foi o Chandriano. Temos grandes expectativas criadas, na forma das tais cantigas infantis, falando sobre o Chandriano e descobrimos que eles estão fortemente enraizados na cultura e nos mitos do passado. Todavia, quando aparecem, vemos só mais um típico assassino sanguinário e seu chefe, de roupa e capuz preto e, por dentro da roupa, uma sombra que fala em itálico e exige que seus subordinados o chamem de ‘Lord Haliax’. Mais um pouco e ele flutuaria seu subordinado no ar com seus poderes Sith resmungando: “You Have Failed Me”.
            Por fim, temos a falta de final do livro. Nas últimas páginas, entra numa tangente sobre um dragão drogado e é isso. Acabou. A história de Kvoethe é interrompida e temos que esperar o próximo. Sim, sei que é uma série, mas tenho essa ideia tola que um livro tem que ter início, meio e fim. Caso seja uma série, deixa alguns hooks pros próximos e só.
            Já estou com o segundo livro, “O Temor do Sábio” em mãos e pretendo lê-lo, dando uma outra chance ao Sr. Rothfuss, ver se tem alguns erros corrigidos ou se ele irá queimar minha língua mostrando que os personagens são mais interessantes do que pareciam, que Kvoethe é falível ou que, pelo menos, a história vai andar pra frente.
            Ah, e só peço desculpas pelo tamanho dessa ‘resenha’ que mais parece um longo relatório bitching sobre o livro, mas só queria escrever um contra-ponto pra tantos e tantos elogios que estão aí na internet. Prometo fazer algo mais curto depois, haha.



terça-feira, 10 de julho de 2012

A Mulher do Viajante do Tempo 
 Audrey Niffenegger.

Esse livro é comovente, é angustiante. É encantador.

A Mulher do Viajante do Tempo conta a história de Henry e Clare. Ele sofre de uma doença genética que, quando sob efeito de emoções fortes ou stress, é transportado para outro tempo, passado ou futuro.

Audrey Niffenegger conseguiu sobreviver a todos os grandes problemas de se escrever sobre viagem no tempo, simplesmente, porque ela simplifica algumas coisas e tem um ponto de vista definido sobre que tipo de alteração uma pessoa fazer no passado/futuro. As discussões – bastante filosóficas – sobre isso permeiam toda a primeira parte do livro, onde algumas dúvidas são esclarecidas.

Uma característica inteligente do livro é a linha cronológica que ela escolheu. Afinal, como escrever um livro onde o personagem principal se desloca no tempo? Onde conversas ocorrem no passado de Clare, mas no futuro de Henry? Que linha cronológica seguir? A do viajante ou a da esposa que permanece no presente? Nenhuma delas é fácil. No início você fica meio perdido, apenas seguindo o caminho traçado pela autora sem pensar muito no quando tudo aquilo aconteceu e se questiona se ela vai ser capaz de levar toda essa história maluca sem se perder nas tantas idas e vindas de Henry. E é por isso que ela escolheu usar tanto a linha cronológica de Clare quanto a de Henry, assim como seus pontos de vista. Apesar de parecer uma escolha complicada, trouxe um resultado bastante claro.

Mas o que torna A Mulher do Viajante do Tempo ainda melhor são os pequenos cuidados que podem ser notados. As inúmeras referências a pensadores, bandas, livros, artistas é incrível e te dá vontade de pesquisar sobre cada um deles. Além disso, os pequenos mistérios ao longo do livro são fascinantes. Pequenas situações que nos são apresentadas pelo ponto de vista da Clare e que ela própria não entende e só são explicadas capítulos mais tardes quando o próprio Henry as vivencia.

Apesar de toda a história de viagem no tempo e doença genética, esse livro está longe de ser um livro de ficção científica. É muito mais sobre o efeito que a distância exerce no amor e como ela o fortifica. Mais importante do que o Henry viajar no tempo, é como não só ele, mas também Clare lidam com o fato da inconstante presença dele e de como é doloroso conhecer aspectos de uma vida que ainda está para acontecer.