Ficando Longe do Fato de Já Estar
Meio Que Longe de Tudo
David Foster Wallace
Qualquer um diria que livros de não-ficção não são o meu tipo
de livro e eu até poderia concordar. Os poucos que tenho ou são biografias de
tenistas/músicos ou falam sobre coisas legais de ciência. Mas, então, como foi
que eu cheguei a um livro de ensaios jornalístico-literários de um escritor de
ficção que pela capa parece uma estrela de rock cheia de atitude e se suicidou
em 2008?
Pelo Youtube.
Eu acompanho dezenas de canais literários, muitos mesmo. Em
um deles, a menina disse que estava muito interessada em ler Ficando Longe do Fato de Já Estar Meio que
Longe de Tudo (para não ficar cansativo, vamos chamá-lo de Fred) e me
peguei pensando no que tinha demais no livro para que ela ficasse tão animada
com ele? Além do título extremamente legal, é claro.
Fui ler a sinopse e...
“Será aceitável mergulhar uma lagosta viva numa panela de água fervente para saciar nossos desejos gastronômicos? O que a experiência de ser “mimado até a morte” num cruzeiro pelo Caribe revela sobre a natureza humana e a maneira como vivemos hoje? O que há de sublime nas raquetadas de Roger Federer e engraçado nas narrativas sufoc....”
PERAÍ, eu li Roger Federer? Roger Federer?
Acho que todo mundo que me conhece sabe que eu adoro tênis,
gosto muito, muito mesmo. Acho que é um esporte fantástico, onde físico e
mental precisam estar alinhados para se vencer um campeonato. Um esporte
solitário que testa todos os seus limites e que vencer ou perder pode,
normalmente, ser reduzido a alguns pontos cruciais ao longo do jogo. E todo
mundo sabe também que eu sou fã do Roger Federer. Foi com ele que eu comecei a
assistir tênis, no ano de 2009. O ano em que ninguém mais acreditava nele, no
ano em que no início ele estava muito velho, muito lento, acabado (snif)... e
acabou sendo um ano espetacular na carreira deles. O ano em que ele chorou na
frente de milhões de pessoas porque ele não estava conseguindo jogar como ele
queria e isso o estava matando (snif)².
Pois bem, melhor eu parar de falar de tênis aqui. Quando eu
vi que tinha uma crônica sobre o Federer em Fred, eu imediatamente fui parar na
ponte aérea Submarino-Saraiva e, por pouco, quase cedi a tentação.
Graças a um pai zeloso e preocupado com os presentes de Natal
da filha, hoje eu tenho em mãos o meu próprio Fred.
Voltando a estrutura do livro. Em Fred há 6 ensaios,
testemunhas das incursões do David Foster Wallace no mundo do jornalismo. O
mais interessante era que ele não era jornalista e, muitas vezes, tais ensaios
fariam jornalistas ortodoxos se revirarem em suas escrivaninhas. A maneira de
escrever de Wallace é íntima (se essa for a palavra correta). A sua voz me
acompanhou durante toda a leitura, a voz de alguém engraçado, a voz de alguém
acessível e bastante observador. Um humor sem pretensão de fazer rir, um humor
que está ali porque é onde deveria estar. Muitas vezes durante a leitura tive
que reler um parágrafo, uma frase.
Uma característica recorrente ao longo do livro é a maneira
como David Foster Wallace começa com um ensaio sobre uma situação aparentemente
normal, como uma visita a Feira Estadual do Illinois ou a Feira da Lagosta do
Maine, e nos leva a uma análise profunda sobre a bovinização do indíviduo, o
habitante do Meio-Oeste americano, a validade de submeter animais a certas
situações porque eu quero ter uma experiência gastronômica notável (esse foi o
ensaio mais pertubador, de longe) e sobre os limites do corpo humano.
Entre todos os contos, meus favoritos foram Ficando Longe do Fato de Já Estar Meio Que
Longe Tudo, Federer Como Experiência
Religiosa e Uma Coisa Surpreendentemente Divertida Que Eu
Nunca Mais Vou Fazer. Pode parecer pretensioso, mas me vi em muitos dos seus
comentários sobre o tempo que passou em um cruzeiro de luxo pelo Caribe
Ocidental (?).
Achei fascinante o poder de observação do DFW, ele
superanalizava as situações ao seu redor de uma maneira que não soava forçada,
chata. Soava sincera. Seus questionamentos me pareciam uma curiosidade honesta
e não uma vontade de parecer mais profundo e cult do que realmente era. Até
suas palavras difíceis e suas notas de rodapé quilométricas me pareceram
naturais.
Fred é o segundo livro do David Foster Wallace traduzido para
o português pela Companhia das Letras, o primeiro é Breves Entrevistas com Homens Hediondos e pelo o que eu entendi
ambos fazem parte de um projeto da editora para familiarizar os leitores
brasileiros a fim de lançar sua obra mais famosa e ‘difícil’ (?), Infinite Jest. Eu irei atrás desses
outros livros com certeza!
Recomendo!