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domingo, 23 de dezembro de 2012

Ficando Longe do Fato de Já Estar Meio Que Longe de Tudo - David Foster Wallace


Ficando Longe do Fato de Já Estar Meio Que Longe de Tudo
David Foster Wallace


Qualquer um diria que livros de não-ficção não são o meu tipo de livro e eu até poderia concordar. Os poucos que tenho ou são biografias de tenistas/músicos ou falam sobre coisas legais de ciência. Mas, então, como foi que eu cheguei a um livro de ensaios jornalístico-literários de um escritor de ficção que pela capa parece uma estrela de rock cheia de atitude e se suicidou em 2008?

Pelo Youtube.

Eu acompanho dezenas de canais literários, muitos mesmo. Em um deles, a menina disse que estava muito interessada em ler Ficando Longe do Fato de Já Estar Meio que Longe de Tudo (para não ficar cansativo, vamos chamá-lo de Fred) e me peguei pensando no que tinha demais no livro para que ela ficasse tão animada com ele? Além do título extremamente legal, é claro.
Fui ler a sinopse e...
Será aceitável mergulhar uma lagosta viva numa panela de água fervente para saciar nossos desejos gastronômicos? O que a experiência de ser “mimado até a morte” num cruzeiro pelo Caribe revela sobre a natureza humana e a maneira como vivemos hoje? O que há de sublime nas raquetadas de Roger Federer e engraçado nas narrativas sufoc....”
PERAÍ, eu li Roger Federer? Roger Federer?

Acho que todo mundo que me conhece sabe que eu adoro tênis, gosto muito, muito mesmo. Acho que é um esporte fantástico, onde físico e mental precisam estar alinhados para se vencer um campeonato. Um esporte solitário que testa todos os seus limites e que vencer ou perder pode, normalmente, ser reduzido a alguns pontos cruciais ao longo do jogo. E todo mundo sabe também que eu sou fã do Roger Federer. Foi com ele que eu comecei a assistir tênis, no ano de 2009. O ano em que ninguém mais acreditava nele, no ano em que no início ele estava muito velho, muito lento, acabado (snif)... e acabou sendo um ano espetacular na carreira deles. O ano em que ele chorou na frente de milhões de pessoas porque ele não estava conseguindo jogar como ele queria e isso o estava matando (snif)².

Pois bem, melhor eu parar de falar de tênis aqui. Quando eu vi que tinha uma crônica sobre o Federer em Fred, eu imediatamente fui parar na ponte aérea Submarino-Saraiva e, por pouco, quase cedi a tentação.

Graças a um pai zeloso e preocupado com os presentes de Natal da filha, hoje eu tenho em mãos o meu próprio Fred.

Voltando a estrutura do livro. Em Fred há 6 ensaios, testemunhas das incursões do David Foster Wallace no mundo do jornalismo. O mais interessante era que ele não era jornalista e, muitas vezes, tais ensaios fariam jornalistas ortodoxos se revirarem em suas escrivaninhas. A maneira de escrever de Wallace é íntima (se essa for a palavra correta). A sua voz me acompanhou durante toda a leitura, a voz de alguém engraçado, a voz de alguém acessível e bastante observador. Um humor sem pretensão de fazer rir, um humor que está ali porque é onde deveria estar. Muitas vezes durante a leitura tive que reler um parágrafo, uma frase.

Uma característica recorrente ao longo do livro é a maneira como David Foster Wallace começa com um ensaio sobre uma situação aparentemente normal, como uma visita a Feira Estadual do Illinois ou a Feira da Lagosta do Maine, e nos leva a uma análise profunda sobre a bovinização do indíviduo, o habitante do Meio-Oeste americano, a validade de submeter animais a certas situações porque eu quero ter uma experiência gastronômica notável (esse foi o ensaio mais pertubador, de longe) e sobre os limites do corpo humano.

Entre todos os contos, meus favoritos foram Ficando Longe do Fato de Já Estar Meio Que Longe Tudo, Federer Como Experiência Religiosa e  Uma Coisa Surpreendentemente Divertida Que Eu Nunca Mais Vou Fazer. Pode parecer pretensioso, mas me vi em muitos dos seus comentários sobre o tempo que passou em um cruzeiro de luxo pelo Caribe Ocidental (?).

Achei fascinante o poder de observação do DFW, ele superanalizava as situações ao seu redor de uma maneira que não soava forçada, chata. Soava sincera. Seus questionamentos me pareciam uma curiosidade honesta e não uma vontade de parecer mais profundo e cult do que realmente era. Até suas palavras difíceis e suas notas de rodapé quilométricas me pareceram naturais.

Fred é o segundo livro do David Foster Wallace traduzido para o português pela Companhia das Letras, o primeiro é Breves Entrevistas com Homens Hediondos e pelo o que eu entendi ambos fazem parte de um projeto da editora para familiarizar os leitores brasileiros a fim de lançar sua obra mais famosa e ‘difícil’ (?), Infinite Jest. Eu irei atrás desses outros livros com certeza!
Recomendo!

sábado, 27 de outubro de 2012

Mort - Terry Pratchett


Detalhes do Livro:
Nome original: Mort.
Tradução: O aprendiz da Morte.
Autor: Terry Pratchett
Lançamento: Original: 1987.
                       Em português: 2002.
 Páginas: Versão comemorativa de 25 anos (lida): 243.
                Versão em português: 256.

À esquerda, a capa original (traduzida) e à direita, a versão comemorativa de 25 anos da série que foi lida por mim




  [ATENÇÃO: O LIVRO FOI LIDO EM SEU IDIOMA ORIGINAL, INGLÊS, PORTANTO MUITOS TERMOS UTILIZADOS PODEM NÃO SER EXATOS, CONSEQUENTES DE UMA TRADUÇÃO LIVRE FEITA POR MIM.]



Mort é o quarto livro da série Discworld, escrita por Terry Pratchett, marcando o início de uma série de livros que possuem como personagem principal a Morte que, curiosamente, teve aparições e papel relativamente relevantes nos livros anteriores da série.
Antes de qualquer coisa, no último parágrafo, chamei a personagem de “a Morte”, porém, no inglês, trata-se de “Death”, gênero neutro. Eu imagino que muitos de vocês saibam disso, mas é válido ressaltar que o livro trata-a como homem na maior parte do tempo. Então não estranhem frases que misturam os gêneros.  E no resto da resenha usarei “Death” para não confundir com Mort.
O plot começa com Mort, filho mais novo de uma família de destiladores de vinho que simplesmente não leva jeito para a horticultura. Numa tentativa de dar um rumo ao filho, o pai de Mort o leva a uma feira na praça da cidade, onde garotos com a intenção de tornarem-se aprendizes em alguma profissão eram avaliados pelos profissionais da cidade, que decidiam se treinaria algum deles em seu ofício.
Exatamente à meia-noite, horário do fim da feira e horas depois do penúltimo garoto ter sido escolhido, Mort e seu pai ainda estão sozinhos na praça, até a chegada de uma figura alta, esquelética e negra sem seu cavalo. Death quer um aprendiz.
Os seres humanos normais são incapazes de ver a Morte. Não se trata de magia nem nada do tipo, elas apenas negam sua existência, fazendo com que o pai de Mort aceite a proposta de Death, acreditando que seu filho será um empreendedor.
          E assim começa a saga de Mort como aprendiz de Death e morador de seu “reino”, aprendendo como as vidas da cada pessoa são medidas por ampulhetas, conhece sua filha Ysabell , seu servente Albert e o cavalo, Binky. Aos poucos, Mort é levado junto quando Death tem que fazer seus serviços e, no seu primeiro dia sozinho em um trabalho, ele comete um erro. Mort sente compaixão.
Como típico da série, Mort repete a façanha de seu antecessor e trata de um assunto sério, a morte, de maneira diferente, misturando a seriedade e talvez até certa frieza com humor mordaz e, às vezes, repetindo minha resenha anterior, bobo. A visão que o livro tem sobre morrer (“Não há justiça, apenas eu.” – Death) parece também refletir diretamente a do autor, vide que ano passado começou um processo de morte assistida ao ser diagnosticado com Alzheimer’s.
Quanto aos personagens, esse é o meu livro favorito da série, pois Death é o mais interessante. Enquanto de um lado não é esclarecida a diferença de caracterização dele do primeiro livro em comparação a agora (mesmo estando relativamente implícito que se tratava de outra entidade se passando por Death e stalkeando o Rincewind. Diferente do esperado, Death não é um assassino ou tem prazer no que faz, não é a Dona Morte da Turma da Mônica que acredito nunca tenha aparecido levando a alma de ninguém e nem é poético como a morte de A Menina Que Roubava Livros. Death é profissional e sabe que seu trabalho deve ser feito, tem um senso de humor e até certa piedade dos seres humanos, o que acaba o levando a conhecê-los mais de perto, nos dias que Mort o ocupa, o que leva a situações engraçadas e até surreais, praticamente marca registrada da série a esse ponto.
Os outros personagens, mesmo que em minha opinião não se comparem a Death, o complementam e são interessantes por si só. Ysabell é filha adotada, mostrando um lado mais sensível da personificação antropomórfica e um tanto mimada, uma falha, entretanto, é sua personalidade ser tão radicalmente diferente da sua pequena aparição em The Light Fantastic. Albert é o servente e o mais próximo de um amigo que Death possui, além de ter um passado muito mais importante do que parece e Mort, o aprendiz, é o resultado de colocar-se um adolescente e, acima de tudo, humano para fazer um trabalho tão importante onde a única regra é não interferir no destino daqueles que devem morrer. Além disso, todos esses personagens têm uma evolução incrível ao longo do livro. Fui reler o começo e mal reconheci as atitudes de Mort, comparado a como ele é no final.
A atmosfera do livro é muito boa, Death’s Estate é uma mistura de uma localização mística, como as ampulhetas e os livros que se escrevem sozinhos para cada pessoa do Disco, e mundano, como o estábulo para Binky, um cavalo de carne e osso. Temos novamente a presença da Unseen Academicals e até uma aparição de outro personagem famoso da série.
O humor continua o mesmo e ainda me agrada. Como já dito, o livro aproveita e coloca Death, um personagem fora do mundo e o coloca em situações tipicamente humanas, há novamente algumas situações de Lampshade Hanging, até por parte do autor e as piadas em que você precisa de um minuto ou dois ou uma semana para entender totalmente.
Sem dúvidas, Mort foi o meu livro favorito da série, talvez por eu ter me afeiçoado a alguns dos personagens principais desde suas primeiras aparições em livros anteriores, porém também por mostrar-se o que melhor balanceou seu humor e seriedade, em como fica até difícil separar os dois em qualquer ponto do livro. Caso a série mantenha esta qualidade, Discworld pode tornar-se uma das minhas favoritas, mas por enquanto irei parar de lê-la para dar atenção a alguns outros livros.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

O Senhor das Moscas, William Golding


O Senhor das Moscas
Willian Golding


Um grupo de meninos vai parar em uma ilha deserta quando o avião em que estavam é derrubado por uma tempestade. Sem nenhum adulto sobrevivente, esses meninos vão ter que aprender a se virar se quiserem sobreviver.

O plot da história é como qualquer outro plot que trata de naufrágio. Após uma catástrofe, os personagens precisam se acostumar e se organizar para que consiga sobreviver em condições adversas, estabelecer uma rotina, se acostumar com a situação. A primeira etapa, portanto, é estabelecer um líder – o Ralph - e estabelecer regras e prioridades para essa nova situação, sendo que a principal é manter uma fogueira na elevação mais alta da ilha.

Na minha opinião é aí que entra a característica que define toda a história. São crianças.

Crianças, de um modo geral, tiveram muito menos contato com o socialmente adequado em termos de comportamento e moral. Não terminaram de ser moldadas. E, por isso, estão mais próximo do que seria o “verdadeiro” ser humano, mais próximo da essência. Eu sei, papo filosófico demais. Mas essa é a grande questão do livro.

O grupo é composto por crianças que variam dos 6 aos 12 anos. É difícil para Ralph, o líder, manter o foco dessas crianças no que realmente importa, serem resgatados, porque é difícil para ELE PRÓPRIO se lembrar algumas vezes. Gradativamente fica cada vez mais difícil para ele se lembrar do que o torna civilizado.

Para mim, essa perda de civilidade é intensificada por outro personagem, Jack. No início, Jack é apresentado como o líder do coral da escola. Quando Ralph reúne todo o grupo pela primeira vez, Jack já é a figura de líder para alguns sobreviventes e quando não é escolhido líder do grupo todo, fica clara a sua posição de antagonista de Ralph. Apesar disso, os dois mantêm uma relação ligada por traços de amizade por quase todo o livro.

Jack logo demonstra uma compulsão pela caça e, ao contrário de Ralph que constrói abrigos e se preocupa com a fogueira, Jack volta todas as suas energias para a caça de porcos selvagens. Ele possui uma atração pelo sangue, pela morte... um instinto selvagem que o torna assustador. Aos poucos perde sua civilidade até o ponto em que se esconde por trás de uma máscara, uma pintura de guerra e parece que tudo passa a ser permitido.  

Ralph e Jack são opostos. Enquanto Ralph tenta conservar sua razão e sua civilidade, sente saudades de sua vida antes da ilha, Jack se entrega completamente a vida selvagem.

Ambos são líderes de seus respectivos grupos. Ralph, no início, devido ao seu carisma e Jack, no final, devido à segurança que a sua agressividade transmite aos outros quando o medo passa a dominar o grupo. Onde antes Ralph tinha o poder no carisma e na sensatez, Jack passa a ter poder no alimento e na violência.
Porquinho, outro personagem consideravelmente importante é quem mantém a razão ao longo de toda a história. Gordinho, com asma e óculos, ele não tem o carisma necessário para convencer o grupo de suas idéias. Quando Ralph passa a ‘esquecer’, Porquinho é sempre que o lembra do porquê de estarem fazendo algo.

Então...

Eu só consigo pensar que O Senhor das Moscas é um livro angustiante. Eu não diria que é um livro surpreendente, porque tudo o que acontece é muito condizente com o que o autor desenvolve no início. Eu achei que ele foi muito claro e aconteceu exatamente o que eu previa. Não do jeito que eu previa, mas, sim, a idéia principal. Mesmo assim, é um livro que eu não conseguia parar de ler, era como não conseguir desviar o olhar de um acidente prestes a acontecer. É empolgante, envolvente... inquietante.

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça & Os Fantasmas de Canterville


Hoje eu não vou falar de um livro específico, mas de dois, porque eles são tão curtinhos que eu acho que quase podem ser considerados contos. São eles A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça e Os Fantasmas de Canterville. Comprei ambos numa daquelas promoções malucas onde todos os livros saem por R$10,00 e que não pertencem mais a minha vida.




A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça
Washington Irving

Acredito que todo mundo tenha pensado imediatamente no filme com o Johnny Depp, dirigido pelo Tim Burton (surpresa!) quando leu o título. E, bem, nós temos um cavalo cavaleiro sem cabeça, uma cidade chamada Sleepy Hollow e um personagem chamado Ichabold Crane. E isso é o mais próximo que o filme chega do livro.

Na história de Washington Irving, o protagonista Ichabold é o professor da fantasmagórica cidade de Sleepy Hollow e se apaixona por Katrina, filha de um próspero fazendeiro e decide conquistá-la. Até que, após um jantar na casa dos pais de Katrina, Ichabold Crane é atacado pela figura do Cavaleiro Sem Cabeça, uma lenda local passada através de gerações.

Eu achei a história incrivelmente... engraçada. Sim, pois é. Eu esperava algo totalmente parecido com o filme, mas não. É uma história completamente diferente. O escritor é bastante irônico ao falar sobre as características dos moradores do interior, suas superstições e até mesmo ao descrever o personagem principal. Ele consegue criar uma atmosfera bastante aconchegante e misteriosa. Gostei muito!





Os Fantasmas de Canterville
Oscar Wilde

Por 300 anos um fantasma assombra a Reserva de Caça Canterville. O atual Lorde Canterville não tem interesse em viver lá desde que sua tia-avó, a Duquesa de Bolton, teve um ataque de pânico quando as mãos de um esqueleto pousaram sobre ela pouco antes do jantar e, por isso, vende sua propriedade para um diplomata americano recém vindo do novo continente, o Sr. Otis. E é aí que a vida (ou seria morte?) do Fantasma de Canterville muda. Aparentemente, a família Otis não se deixa intimidar por sua presença fantasmagórica.

Eu tinha certo preconceito contra Oscar Wilde. Essa Mariana, aos 14 anos de idade, ficou um pouco traumatizada quando tentou ler O Retrato de Dorian Gray pela primeira vez na vida. Então, para mim, Oscar Wilde sempre foi o escritor mais chato de todos. Ele era o meu modelo de chatice. Toda vez que alguém me perguntava: “Não é possível,  você gosta de ler qualquer coisa?”, eu sempre respondia: “Não, eu odeio Oscar Wilde.” Eu era feliz odiando-o e proclamando sua chatice ao mundo.
Mas, aí, eu li esse livro.

 E é MUITO LEGAL. É fantástico. É engraçado, é irônico, é crítico. Pelo o que eu li sobre o Oscar Wilde depois de ter lido esse livro, uma característica dele é a sua crítica a sociedade inglesa e é exatamente o que ele faz ao longo de todo o livro. O embate entre o maléfico fantasma de Canterville, responsável pelas maiores atrocidades contra seus contemporâneos, e a insensível família americana que não tem a dignidade de se sentir assustada com um fantasma de tal gabarito. Quem sabe termino de ler Dorian Gray depois de seis anos?








sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Equal Rites - Terry Pratchett

                    Detalhes do Livro:
Nome original: Equal Rites.
Tradução: Direitos Iguais, Rituais Iguais
Autor: Terry Pratchett
Lançamento: Original: 1987.
                       Em português:2002.
Páginas: Versão comemorativa de 25 anos (lida): 213.
                Versão em português: 221.

À esquerda, a capa original (traduzida) e à direita, a versão comemorativa de 25 anos da série que foi lida por mim.    




[ATENÇÃO: O LIVRO FOI LIDO EM SEU IDIOMA ORIGINAL, INGLÊS, PORTANTO MUITOS TERMOS UTILIZADOS PODEM NÃO SER EXATOS, CONSEQUENTES DE UMA TRADUÇÃO LIVRE FEITA POR MIM.]

           Equal Rites é o terceiro livro da série Discworld escrita por Terry Pratchett, diferenciando-se por não se focar mais no inepto mago, Rincewind, porém ainda passando-se no mesmo universo, o Disco, o início de uma tradição da série, mudança de personagens principais a cada livro até a eventual formação de 4 ou 5 histórias simultâneas, mas isso fica pra resenhas futuras...
            O plot começa quando Drum Billet, um mago perto do final de sua vida, chega no pequeno vilarejo de Bad Ass (Sério.). Sua vinda deve-se ao fato de que lá nascerá um oitavo filho de um oitavo filho. É sabido que o 8 é um número poderoso e que todos os oitavos filhos têm potenciais mágicos notáveis, duplamente no caso da criança que está por vir. Então Drum Billet resolve deixar seu cajado, símbolo da graduação de um mago e fonte de poder para a criança que está pra nascer. Na pressa para transferir rapidamente o cajado antes que chegue sua hora, o mago ignora os avisos de Granny Weatherwax, bruxa do vilarejo, parteira e uma das personagens principais, de que o bebê trata-se de uma menina, só ouvindo-a quando é tarde demais. Assim, tem-se, pela primeira vez no Disco, uma mulher maga: Eskarina.
Eskarina cresce como uma criança normal, porém começa a apresentar poderes mágicos de tal magnitude que ele ‘vaza’, assim, Granny Weatherwax oferece a Eskarina a oportunidade de ela ser sua aprendiz e tornar-se bruxa, controlando seus poderes, que caso não sejam domados podem chamar a atenção de criaturas perigosas das Dungeon Dimensions, lar de monstros dignos de pesadelos. Mas toda essa iniciativa de Granny não consegue conter o desejo de Eskarina de tornar-se maga e tentar a sorte na Unseen University, contra todo o preconceito.
Antes de qualquer coisa, vale-se notar que este assunto foi abordado sutilmente nos dois livros anteriores, normalmente por meio de anedotas, em que não se permitia que mulheres ingressassem na Unseen Academicals, universidade de magia, pois se temia que elas fossem magas competentes demais, por exemplo. Neste livro, rapidamente é feita a distinção que permeará toda a história. Apenas homens são magos, já que não aceitam mulheres, apenas mulheres são bruxas, pois os homens consideram seu ramo de magia muito inferior.
Eskarina é uma personagem jovem, de personalidade forte e que simplesmente não consegue entender porque não lhe permitem iniciar seus estudos de magia por ser mulher, mesmo ela apresentando talento inimaginável. Em suas viagens até a Unseen University, ela conhece Simon, um menino gago e tímido, com potencial tão grande quanto o dela, talvez maior. Mesmo com poderes comparáveis, Simon está sendo escoltando por um professor da universidade pessoalmente e sendo paparicado como o próximo grande gênio a pisar na universidade, enquanto Eskarina, tão similar, é ignorada simplesmente por ser mulher, formando um paralelo interessante.
Já Granny Weatherwax é outra personagem inédita pela série e, pelo o pouco que sei dos livros futuros, permanecerá durante boa parte da série. É uma velha bruxa, talvez uma das melhores, sem papas na língua e um pouco arrogante e rabugenta. Por meio dela, neste livro, somos apresentados ao mundo das bruxas. Bruxas possuem uma gama de funções, sendo responsáveis por partos, como já ditos, cura de doenças utilizando ervas, preparo de poções, algumas fortemente similares com remédios, e, é claro prática de magia. Mas até sua magia é diferente, enquanto a dos magos é extremamente complicada e ‘glamourosa’, a das bruxas é velada, tendo como suporte a Headology. Em linhas gerais, a Headology é o poder da crença e eu irei me abster de outros comentários, para não estragar todo o humor das várias instâncias de Headology pelo livro.
Esses personagens, já interessantes por si só, tornam-se muito mais pelo contexto de preconceito e, sendo mais específico, sexismo que forma o esqueleto da história. Granny Weatherwax representa o caso oposto do preconceito dos magos pelas bruxas, inferiorizando a magia à favor da bruxaria, talvez como mecanismo de defesa ou talvez por ela simplesmente ser tão boa bruxa assim. Eskarina, por sua vez, é a menina recém envolvida neste contexto e que repete a inconfortável pergunta: POR QUE mulheres não podem estudar magia?
Outro ponto interessante é que os perpretadores deste machismo são ignorantes aos seus motivos. Talvez minha escolha de palavras não tenha sido a melhor, mas o que quero dizer é que de Simon, o aluno genial, até a Cutangle, o Archchancellor da Universidade, a resposta para as perguntas de Eskarina é a mesma, que mulheres não podem estudar magia porque é contra a tradição, nunca aconteceu antes. E isso, pra eles, é motivo suficiente para finalizar a discussão, sem saber o porquê desta tradição existir e, mais importante, porque exatamente ela deve ser mantida.
O que, na minha opinião, faz este livro ser esplêndido é que, enquanto há assuntos sérios sendo abordados, a abordagem é, digamos assim, bem-humorada. O livro definitivamente não faz pouco caso do problema que está tratando e o critica abertamente, mas nunca perde aquela pitada de, digamos assim, bobeira. Mesmo sendo uma metáfora para a dificuldade das mulheres entrarem em certos nichos estereotipicamente masculinos, ainda se trata de uma história de uma menina com poder vazando tentando entrar na universidade de magia, enquanto monstros baseados nas histórias de H.P. Lovecraft são atraídos por seu poder e de Simon, na tentativa de invadir a dimensão do Disco.
Em suma, Equal Rites faz o balanço entre o típico humor de Terry Pratchett e a abordagem de um assunto social sério, tornando sua leitura uma atividade incrivelmente prazerosa.

1984, George Orwell



1984
George Orwell


1984 é um livro e tanto. Não sei muito como começar a falar dele, porque é um livro MUITO  BOM. Sem firulas, sem complicação. Um livro que traz idéias sólidas, análises brilhantes. George Orwell mostra que é um visionário.

O mais interessante do livro não é propriamente a história do personagem principal, o que não quer dizer que não seja excelente. Winston Smith é um personagem daqueles enternecedores, que te fazem sentir orgulho e motivadores. O interessante do livro é o mundo que Orwell criou para a sua narrativa, o sistema político, a análise cruel que ele fez tanto de eventos históricos quanto da mente humana. É um livro absolutamente coerente.


Mundo.

Nesse mundo existem três grandes territórios: Oceânia, Lestásia e Eurásia. Essas três nações estão constantemente em guerra uma contra as outras, apenas alternando as combinações de aliança. A história se passa em Oceânia.

Devido a essa eterna guerra a população – dividida entre membros do Partido e os proletas - passa por uma série de racionamentos, vivendo em condições relativamente restritas.


Política.

O Partido é a organização que governa a Oceânia. A grande figura central do Partido é o Grande Irmão (the Big Brother is watching you). Visto como um líder e uma personalidade onipresente. É dessa idéia que surgiu programas de reality show como o Big Brother Brasil.

 Os membros do Partido são divididos em Núcleo do Partido, que são os membros de mais alto escalão e o Partido Exterior, membros responsáveis por tarefas mais mecânicas, que permitem o funcionamento de toda a máquina política.

Existem quatro grandes divisões, que são o Ministério da Verdade – responsável pelas informações divulgadas para população, assim como sua manipulação quando necessário; o Ministério da Paz - responsável pela manutenção da guerra com outras nações; o Ministério da Pujança – responsável pela distribuição das rações diárias à população; e o Ministério do Amor – que era responsável por inibir as relações sexuais e fomentar o ódio às outras nações e aos traidores do Partido através de eventos como Dois Minutos de Ódio e Semana do Ódio.

A população é controlada através de teletelas, equipamentos que registram os movimentos e sons gerados em seu alcance. As informações obtidas através da teletela são analisadas por membros da Polícia das Idéias e qualquer pensamento crime identificado é passível de punição e em certos casos a pessoa é vaporizada. A  vaporização não envolve somente a execução do infrator, todos os seus dados, qualquer menção feita a essa pessoa em meios de comunicação é apagado. É como se nunca tivesse existido.


Personagem.

Eu achei  que a sinopse fornecida pelo livro deu muitas informações sobre o que acontece com o personagem principal e isso criou uma sensação de ‘já sei o que vai acontecer em seguida’. Por isso, não pretendo dar a mesma quantidade de informação aqui. Acho interessante supor o futuro dele ao longo da história, sem se basear na sinopse.

Winston trabalha no Ministério da Verdade e é responsável por alterar informações de jornais para que todas as reportagens feitas no passado sejam condizentes com as declarações atuais do Partido. A partir daí, Winston começa a questionar todo o sistema político de Oceânia, o comportamento da população e a realidade.

Winston não é um personagem perfeito, ele se dispõe a fazer coisas e tem sentimentos bem controversos. Mas Winston é um personagem envolvente, que você começa a torcer a favor e que traz certo orgulho (?).


Opinião.

Durante a leitura, George Orwell nos apresenta a um mundo de críticas duras e corretas à sociedade, à política, à mentalidade humana e isso te faz pensar e te faz ver que elementos daquele cenário distópico, futurista (ele escreveu em 1948, o livro se passar por volta de 1984, então, né? Futurista.) estão no nosso mundo HOJE. As críticas são atuais e estão aqui, por todo lado... É só olhar.

1984 tem tantas mensagens, que eu acredito que cada um tem a sua própria, aquela que de certa forma te chama mais atenção, te deixa mais preocupado. Para mim foi justamente a dos meios de comunicação e a memória curta da população.

Por trabalhar, literalmente, alterando o passado, manipulando informações, Winston tem muitas dúvidas quanto à credibilidade das informações que chegam até ele e consegue perceber o poder que os meios de comunicação em geral tem. O poder de fazer algo não existir. Não digo apagar como na história, mas deixar marcas profundas no inconsciente e criar tendências. E o quão perigoso é tanto poder na mão de poucas pessoas. E eu acho isso assustador. Eu penso logo no poder que a Globo possui, se ela optar por deixar de transmitir algo, para uma grande parte da população é como se não acontecesse. Quantas coisas ela deixou optou por não transmitir desde então? Digo coisas relevantes, claro.

Outro ponto que foi como uma grande pedra esmagando o meu cérebro é o modo como outros personagens no livro não possuem memória, não se interessam e por isso não se lembram de coisas que acabaram de acontecer. Isso me lembrou instantaneamente o Fernando Collor sendo eleito senador, sendo que sofreu impeachment como presidente. Ou até  mesmo José Sarney. As pessoas esquecem.

Entre outras críticas, o livro trata da necessidade de poder do ser humano, a maneira como as guerras passam a ter papéis importantes em uma sociedade, de até que ponto um governo pode invadir a privacidade e impor situações para proteger a população.

Além disso, ao explicar como o mundo chegou até a situação do livro, George Orwell faz uma análise do comunismo, absolutismo, revolução francesa com tanta clareza que é fascinante. E esse é um dos seus pontos positivos. Apesar de ser um clássico, não há nada daquele vocabulário e daquelas construções complicadas que te fazem ler duas vezes a mesma frase e que são características atribuídas normalmente à clássicos. É um livro fácil, simples e direto. Enquanto eu ainda estava lendo, já queria relê-lo...

Eu não falei tudo o que eu gostaria e nem como eu gostaria. E eu não acho que eu tenha passado a grandiosidade que este livro é. Eu gosto muito de política e história, nem tanto de políticos. Se, por acaso, é esse o seu estilo, 1984 é O livro.





domingo, 2 de setembro de 2012

The Light Fantastic - Terry Pratchett

Detalhes do livro:
Nome original: The Light Fantastic.
Tradução: A Luz Fantástica.
Autor: Terry Pratchett
Lançamento: Original: 1986.
                       Em português: 2002.
Páginas: Versão comemorativa de 25 anos (lida): 241.
                Versão em português: 227.

À esquerda, a capa original (traduzida) e à direita, a versão comemorativa de 25 anos da série que foi lida por mim.    


[ATENÇÃO: O LIVRO FOI LIDO EM SEU IDIOMA ORIGINAL, INGLÊS, PORTANTO MUITOS TERMOS UTILIZADOS PODEM NÃO SER EXATOS, CONSEQUENTES DE UMA TRADUÇÃO LIVRE FEITA POR MIM.]

[ATENÇÃO: POR SER TRATAR DE UMA SEQUÊNCIA DIRETA, ESTA RESENHA PODE CONTER REVELAÇÕES DE ENREDO DO LIVRO ANTERIOR, THE COLOUR OF MAGIC.] 


The Light Fantastic (A Luz Fantástica) trata-se do segundo livro da série Discworld, escrita por Terry Pratchett, sendo a sequência direta de The Colour of Magic, começando exatamente de onde seu antecessor parou.
O plot começa com o Octavo, o livro com os 8 feitiços utilizados pelo próprio Criador para criar o universo,  mudando completamente o Disco à fim de impedir que Rincewind, que possui algo muito importante preso na sua cabeça, e Twoflower caiam da borda do disco. Esta mudança acarreta na descoberta de que Great A'tuin, a tartaruga que carrega o próprio disco, está caminhando em direção a uma grande estrela vermelha e os magos da Unseen University, que são os únicos que podem descobrir do que se trata tal sequência de eventos, estão enfrentando suas próprias disputas políticas.
Como se pode notar, The Light Fantastic difere de The Colour Of Magic por tratar-se de uma história única e não dividida em pequenas aventuras sem muita continuidade. O resultado disso é uma história mais forte, coerente e um livro sem divisão de capítulos (que para os neuróticos, como eu, que só gostam de parar no começo de um capítulo novo, me fez ler o livro quase todo de uma vez).
Vale ressaltar que, apesar de agora ter maior importância, a história compartilha o primeiro plano com o humor e um dos pontos fortes do livro é nenhum sofrer em detrimento do outro. Ainda há momentos extremamente aleatórios, não se enganem, como, por exemplo, os personagens principais caírem de uma distância enorme e aterrissarem em uma rocha voadora gigante com druidas vivendo lá. O que quero deixar claro, é que mesmo havendo uma plot única, há a complementação entre história e humor. Neste mesmo asteróide com druidas, eles conhecem um personagem que irá acompanhá-los até o final da jornada. Estranho? Sim. Talvez até forçado e que não será do gosto de todos, mas acredito esta ser a intenção.
O humor segue a mesma linha do anterior e entrar em detalhes seria apenas me repetir. O que farei de qualquer forma. É aleatório, é bizarro e nem sempre inofensivo. Os mesmos druidas que eu ando mencionando parecem paródias do estereótipo ‘nerd’ dos anos 80, arrogantes e maníacos por computador. Existem as piadas mais óbvias como a existência do personagem Cohen, The Barbarian. E, com certeza, existem aquelas que eu não entendi.
Um ponto novo neste livro, entretanto, é a presença de algumas anedotas um pouco mais sérias. O narrador, em 3ª pessoa, ao se deparar com a situação de ter que descrever uma mulher guerreira, entra em uma breve tangente sobre o absurdo da existência deste estereótipo de mulheres que lutam sempre usando poucas roupas e sendo voluptuosas e jovens (e, é claro, subverte todos esses clichês.). Tendo em vista que machismo é o tema do próximo livro da série, imagino se este é o começo de uma vontade de abordar o assunto.
Esta crítica, todavia, é feita de maneira bem humorada e termina recomendando que, antes de escreverem sobre mulheres que lutam, os escritores de livros de fantasia “tomem um banho frio”.  Esta não é a única instância de aparentes comentários sociais velados. Com a aproximação de uma enorme estrela vermelha, forma-se uma seita religiosa adorando-a, que domina cidades, queimando os que acreditam em algo diferente ou as minorias raciais. Diferentemente do caso anterior, esta parte é narrada com certa seriedade, deixando o humor para as reações dos personagens principais.
Quanto a ser uma continuação direta, The Light Fantastic deixa pouco a desejar. A caracterização dos personagens, principalmente Rincewind, é aprofundada, o plot é a sequência lógica do anterior e o universo em si da história é consistente. Falando na propriedade de alguém que já leu os dois próximos livros da série, The Light Fantastic introduz as duas localidades mais importantes para os mesmos (Unseen University e Death's Domain, respectivamente) e sabe-se lá em quantos mais. Além disto, conforme escrevia esta resenha, me dei conta que o desenrolar e o final deste livro tornam do prólogo de The Colour Of Magic um grande Foreshadowing. Interessante.
Por fim, achei The Light Fantastic fantástico e o recomendo com as mesmas reservas que tive em The Colour Of Magic.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

The Colour Of Magic - Terry Pratchett



Detalhes do livro:
Nome original: The Colour Of Magic.
Tradução: A Cor da Magia.
Autor: Terry Pratchett
Lançamento: Original: 1983.
                       Em português: 2001.
Páginas: Versão comemorativa de 25 anos (lida): 210.
                Versão em português: 232.
À esquerda, a capa original (traduzida) e à direita, a versão comemorativa de 25 anos da série que foi lida por mim.    

[ATENÇÃO: O LIVRO FOI LIDO EM SEU IDIOMA ORIGINAL, INGLÊS, PORTANTO MUITOS TERMOS UTILIZADOS PODEM NÃO SER EXATOS, CONSEQUENTES DE UMA TRADUÇÃO LIVRE FEITA POR MIM.]

The Colour Of Magic (A Cor da Magia, em tradução livre), primeiro livro do que se tornaria a série Discworld (contando atualmente com 39 livros, algumas adaptações cinematográticas e algumas ‘short stories’), publicado em 1983 por Sir Terry Pratchett trata-se de uma paródia do gênero fantasia, não muito diferente de como Douglas Adams parodiou a ficção científica.
O mundo é um grande disco, apoiado em quatro enormes elefantes que, por sua vez, encontram-se em cima de uma grande tartaruga que anda lentamente pelo espaço, sem seus habitantes saberem de onde exatamente ela está vindo e para onde dirige-se. E neste disco encontra-se o típico cenário de fantasia medieval que estamos familiarizados.
A história se desenrola quando Rincewind, mago inepto e renegado da universidade de magia por ter quebrado uma de suas maiores leis, aceita ser o guia turístico de Twoflower, habitante de um continente longínquo do outro lado do Disco, o Counterweight Continent (Continente Contapeso, em tradução livre). Twoflower é sempre acompanhado por Luggage, seu baú de viagens sapiente que o segue onde quer que ele vá com suas centenas de minúsculas pernas e uma personalidade homicida. Explorando o disco, esses personagens encontram desastre e situações de vida ou morte onde quer que vão. (Ou será que eles que as levam consigo?)
Como vocês devem ter reparado, não existe um plot firmemente construído. A versão que eu li é dividida em quatro partes (Li na internet que alguns são divididos em seis, mas posso estar enganado) e cada uma é basicamente uma história por si só. Toda a exposition necessária para o desenrolar da história está contida em si mesmo e todas elas possuem início, meio e fim definidos, sendo apenas conectadas entre si por poucos elementos, como a presença dos deuses. E, claro, a situação dos personagens.
Tal forma de construir a narrativa me faz entender que, inicialmente, o plano nunca foi uma grande série. E sim uma forma de, em um mesmo livro, ter um número de situações em que se possa parodiar diferentes aspectos do gênero e autores. Um desses quartos do livro, por exemplo, parodia se não diretamente os trabalhos de H.P. Lovecraft, pelo menos o gênero de Cosmic Horror. Além disso, também se zomba da sociedade dentro de seus paralelos. Enfim, há dragões, magos, bárbaros, heróis, ladrões, políticos e corretores de seguro e todos são igualmente sacaneados por Sir Terry Pratchett.
Enquanto que, na minha última resenha, “O Temor do Sábio”, eu reclamei bastante sobre o fato do livro ser tão episódico, The Colour Of Magic foi uma tentativa bem-sucedida de uma história basicamente formada por histórias menores. O fato de muitas vezes ser tão desconexo não prepara o leitor para qual próxima situação Rincewind e Twoflower se meterão, faz imaginar o que exatamente será motivo de chacota e o quão anticlimático vai ser o final.
Diferente do que possa parecer pelos meus parágrafos acima, apesar de tudo, a paródia nunca é ofensiva. É sempre feita apenas como referência ao trabalho original e é, de certa forma, afetiva. Apesar de ser uma grande deconstruction do gênero fantasia, The Colour Of Magic é, e tornou-se com o passar dos anos um dos mais famosos e clássicos, livros de fantasia.
Por essas e outras, tenho um pouco de dificuldade em definir como é o humor da série. Não queria usar este termo, porém diria que é ‘britânico’. Baseando-se bastante no dualismo entre o absurdo e mágico e o extremamente mundano, o humor aproveita de todas as ferramentas de um livro para exprimir-se. Há piadas com jogos de palavras, há descrições mundanamente simples de fenômenos previamente caracterizados como indescritíveis, há monólogos do autor pouco relevantes ao assunto que está sendo tratado no livro, há a noção da existência da fourthwall, enfim. Devido a todos estes recursos, repara-se que trata-se de um livro extremamente complicado de traduzir-se e vender em outros países.
Todavia, humor é algo extremamente subjetivo e, enquanto particularmente achei genial na maioria das vezes, uma pessoa menos acostumada pode estranhar esta maneira de fazer humor. Ou, obviamente, pode simplesmente não gostar. Dificilmente recomendo livros (e resolvi fazer um blog de resenhas. Ha.) e este seria mais um deles. Não se enganem, adorei-o e continuarei a explicitar os porquês à diante, mas por se tratar de algo tão pessoal, fica um pouco complicado.
O ponto mais forte de toda a narrativa do Sir Terry Pratchett é que, como autor, ele respeita a inteligência dos seus leitores, algo que senti muita falta nos últimos livros que li, os que fiz resenha até agora também incluídos.
Em alguns pontos, ele até superestimou a minha inteligência. Após o término da leitura, pesquisei e me deparei com um site constando as referências de The Colour Of Magic e me dei conta do número de outros livros e autores parafraseados, parodiados, com personagens de mesmo nome, etc ao longo do livro que eu não havia reparado. Admito que alguns deles não havia nem ouvido falar.
Então, como achar graça de piadas que são se entendem? Bom, essas referências não constituem a totalidade do humor do livro e, a cada duas que não são reparadas, existe uma que você desvenda e sente-se satisfeito por isso. Em qualquer página, o leitor pode se sentir recompensado, mesmo que isso seja em detrimento do plot.
Como já mencionado, existem piadas de várias formas. Jogos de palavras, como Twoflower trabalhar com Inn-Sewer-Ants, pequenos enigmas, como lá no Counterweight Continent existir a reflected-sound-of-underground-spirits (essa admito que o livro teve que basicamente me falar o que era.) ou até conceituais como, novamente, Twoflower ser o típico estereótipo de turista oriental que temos que sai por aí batendo foto das coisas mais inócuas , acredita que entenderão seu idioma se ele fala alto e lentamente e achar que todos à sua volta são homens de boa fé. A cor da magia, titular do livro, trata-se da oitava cor, Octarine, a mais bonita e rei de todas as outras, visível apenas para os magos, indescritível... Mas é apenas um roxo amarelado esverdeado E isso eu só estou comentando das piadas encontradas nas primeiras páginas.
Li em alguns lugares e conversei com alguns (um) fãs (fã) da série que um dos maiores problemas de The Colour Of Magic é sua falta de consistência em caracterização e elementos da história em relação a outros livros. Por enquanto, como estou no começo, isso ainda não é verdade, porém resolvi ler mais alguns livros da série para averiguar.
Por fim, um livro com pouco plot focado em parodiar, simultaneamente, o gênero de fantasia dos livros e também elementos da nossa vida cotidiana, The Colour Of Magic me agradou bastante.

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Belas Maldições, Neil Gaiman & Terry Pratchett



Belas Maldições
Neil Gaiman e Terry Pratchett


O que acontece quando se junta um autor invariavelmente famoso e adorado com outro, invariavelmente desconhecido e venerado?

Um livro invariavelmente muito engraçado.

Não do tipo que te faz gargalhar histericamente de vez em quando, mas daquele que você lê com  um sorriso nos lábios do início ao fim e que volta e meia faz com que se receba olhares tortos de pessoas próximas que assistem a disputa do bronze do tiro com arco. (A Coréia do Sul (?) ganhou, caso alguém se interesse, apesar de eu estar torcendo bastante para o carinha de óculos do México.)

Bem, eu estou falando de Belas Maldições escrito por Neil Gaiman (o famoso) e Terry Pratchett (o desconhecido).


Os Autores.

O Neil é responsável por livros como Stardust, Deuses Americanos, Coraline e pela HQ Sandman e – apesar da minha recente implicância com ele por causa das postagens e propagandas sem-graça que ele feito no blog dele– ele sabe, não só escrever bem um livro, mas como criar uma história. (O meu favorito é Stardust!)

O Sir Terry Pratchett é um daqueles autores absurdamente famosos. Mas muito famosos mesmo. (Negrito e itálico, isso que é enfatizar.) Mas que você nunca ouviu falar dele na sua vida inteira, até que aconteceu. Seus livros se passam basicamente em um único universo, o Discworld, o que pode parecer falta de criatividade. Mas eu digo com toda a minha experiência de apenas um livro dele lido, o que não falta nesse homem é criatividade.


A Sinopse (ou coisas bem-boladas e estrategicamente pensadas para chamar a sua atenção e te fazer ler esse livro sem parecer tudo muito intimidante).

O Apocalipse está prestes a acontecer, o Anticristo – a criatura mais poderosa da Terra e alguém extremamente preocupado com o meio ambiente – está prestes a se manifestar e um anjo e um demônio não gostam nem um pouco do que isso tudo está prestes resultar.

Aziraphale o anjo e Crowley o demônio gostam muito deste mundo, aqui eles se sentem confortáveis e já estão bastante acostumados e, por isso, decidem juntos impedir que toda essa história desnecessária de guerra entre o céu e o inferno e, consequentemente, o fim do mundo aconteça conforme planejado pelos seus Superiores (um caso de insubordinação bíblica), e, para isso, precisam lidar com a série de inconveniências que aparecem com o tempo como caçadores de bruxas, bruxas, precipitações climáticas envolvendo peixes e.. lagostas, desmaterializações e, claro, a maneira como qualquer cd que permaneça dentro do carro por mais de três dias insiste em se transformar em um cd dessa banda inglesa bem famosa. Além, claro, de matar o Anticristo.  E precisam fazer tudo isso até – como descrito no livro “As Belas e Precisas Profecias de Agnes Nutter, Bruxa” ­– sábado. O próximo sábado.

E claro. Há um grande mal-entendido.


A Opinião.

Eu nunca gostei particularmente de histórias envolvendo anjos, demônios ou nada remotamente religioso. Mas Belas Maldições vale muito a pena. É um livro incrivelmente engraçado, com aquele humor que lembra O Guia do Mochileiro das Galáxias, um humor bem britânico. Cheio de ironias e referências a todas essas maluquices do mundo moderno, a cultura pop e incoerências bastante humanas.

Como na história um anjo e um demônio se juntam para impedir o Apocalipse e manter o mundo do jeito que ele é, há uma série de embates morais entre eles, te fazendo pensar no que seria o bem e o mal, na necessidade do Apocalipse e toda essa guerra entre o Bem e o Mal. Sobre o que esse plano inefável seria realmente.

Tendo lido livros dos dois autores, eu consigo ver em todo o livro um pouco do estilo de cada um e, ao mesmo tempo, ambos estão tão bem costurados que não dá para dizer que parte um ou outro escreveu, o que eu acho incrível (Enfatizar! Enfatizar!).  E queria muito saber como foi que eles começaram isso tudo. Eles pensaram na história toda antes de sentar para escrever ou o destino dos personagens veio conforme as letrinhas apareceram?

Acima (ou abaixo, dependendo do referencial) de tudo, o que eu mais gostei foi a maneira como o livro foi escrito. Eu adoro digressões. Sou uma fã incondicional de digressões. Eu poderia ser presidente do partido dos utilizadores de digressões em obras literárias (PUDOL, nosso símbolo é uma flecha com enfeites mexicanos – sim, eu estava realmente torcendo para ele – e estaremos concorrendo para a secretaria legislativa da ABL em 2017, contamos com seu apoio).

 Afinal, quem precisa de uma linha contínua de idéias? Informações aleatórias sobre fatos aleatórios é o que há de melhor!

Enfim, é um livro muito bom que trata de temas um tanto quanto delicados, mas consegue fazer isso com personalidade, humor, ironia e delicadeza. Sem ofender ninguém.


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aqui tem um link para uma pequena lista de resoluções de fim de ano do Crowey e do Aziraphale escrito pelos autores. Bem legal.

E pesquisando no Dicionário inFormal, descobri que inefável significa “...[aquilo] que não pode ser expresso verbalmente. Algo de origem divina, dotado de tantos atributos de perfeição e beleza, que transcende os limites da linguagem humana.” Isso pode ser útil para alguém, algum dia.


terça-feira, 24 de julho de 2012

O Temor do Sábio - Patrick Rothfuss

 
Detalhes do livro:
Nome original: The Wise Man's Fear.           
Tradução: O Temor do Sábio.
Autor: Patrick Rothfuss. 
Lançamento: Original: 2011. (Março)
                       Em português: 2011.  (Novembro)
Páginas: Versão "Hardcover" original: 994.
                Versão em português: 960.   



[ATENÇÃO: ESTA “RESENHA” CONTÉM PEQUENOS SPOILERS, COMO NOMES DE PERSONAGENS E ALGUNS ACONTECIMENTOS FUTUROS NA TRAMA.]
 
“O Temor do Sábio”, segundo livro das crônicas do Matador do Rei (por que não Regicida?), continuação direta de “O Nome do Vento”, livro da minha resenha anterior.
Antes de começar os pormenores, acho cabível dizer que achei “O Temor do Sábio” uma leitura inferior comparado ao seu antecessor.  O que não quer dizer que não houve melhorias do primeiro para o segundo, só que os fatores que pioraram com certeza são mais expressivos.
O Sr. Rothfuss parece ter retroativamente ouvido algumas das minhas reclamações e fez mudanças de acordo como, por exemplo, a caracterização, ponto que frisei bastante na última resenha. Os personagens do ambiente da Universidade estão um pouquinho mais complexos e profundos. Talvez pela sua simples aparição e permanência do livro, dando-lhes situações diferentes para que possam reagir e para os leitores absorverem um poucos mais de suas personalidades. Aquele grande resumo da última resenha ainda se aplica, e aquelas características ainda descrevem os personagens com razoável margem de segurança, mas não é mais aquele festival de uni-dimensionalidade de antes. Caso eu tampe o nome dos personagens e leia seus diálogos, talvez agora consiga reconhecer quem fala o quê sem ter que recorrer a seus estereótipos.
Essa melhora na caracterização nos é recompensada com eles sendo retirados da trama da segunda metade do livro, quando Kvoethe larga a Universidade por alguns períodos para andar pelo mundo devido a desavenças com seu rival, Ambrose.
Os novos personagens novamente não se mostram tão simples quanto os do livro anterior pareceram, mas o processo de torna cansativo. Talvez meu maior problema com o livro seja esse. O processo. É difícil explicar. O livro é como se fosse uma grande série televisiva com seus inúmeros episódios. Existem aqueles episódios importantes pra trama e pro MythArc em geral e tem aqueles que são aventuras avulsas. O livro, principalmente sua segunda metade, parece uma grande coletânea desse segundo tipo de episódios. Kvoethe faz algo legal ali, faz mais algo acolá. Kvoethe conhece personagens novos, tem aventuras com eles por cerca de 100 páginas e depois eles não aparecem mais e ele vai pra outra região do mapa com novos personagens e novas aventuras. Nenhum desses personagens tem tempo razoável para sua caracterização e duvido que todos eles terão importância futura.
O problema principal é que são esses seus feitos avulsos os de maior importância no livro. Sim, não vou negar que tem algo importante ali no meio, sem querer dar muitos spoilers, o encontro com Feluriana parece que terá repercussões. Mas da grande Badass Boast que Kvoethe dá no começo de O Nome do Vento, só presenciamos até agora, um ou dois feitos relevantes (sendo o encontro com Feluriana um desses.).  O que me deixa apreensivo para o próximo livro, ele pode acabar contrastando demais com a pacing do resto da trilogia.
O fato de “nada acontecer” é o erro mais gritante de pacing. Lemos quase mil páginas e não tem nenhum prêmio no fim do caminho. Novamente não há antagonista palpável, apesar do livro introduzir mais um deles, na forma de Cthaeh. A premissa até é interessante, é um ser selado em uma árvore que vive no mundo dos Encantados (quase Exdeath) e pode ver o futuro. Não se preocupem, estou guardando os detalhes mais relevantes, porém tomem nota que o personagem não é explorado, assim como todos os outros antigos antagonistas.
Ambrose, rival do protagonista, cresce no status de rival ao começar a cortejar Denna, amada de Kvoethe. Entratanto, ele desaparece na metade do livro devido ao afastamento de Kvoethe da Universidade.
O Chandriano é mencionado em conversas entre personagens, é conseguida um pouco mais de informações sobre eles, porém sua real presença é reduzida a um cameo. Então, temos dois antagonistas (sendo um deles um grupo de 7 pessoas) pouco trabalhados e outro recém-introduzido na história sem nenhuma previsão de resolução, casa haja uma. Ou, na falta de resolução, pelo menos o andamento do plot.
Temos um melhor insight na arte da Nomeação agora que Kvoethe encontra-se sob a tutela de Elodin, o excêntrico professor e Nomeador-mor. Ainda não cheguei a uma conclusão se o Sr. Rothfuss às vezes força demais a barra para tornar Elodin o típico professor louco-porém-genial.
            O fato de Kvoethe resolver andar pelo mundo na segunda metade do livro pareceu uma boa oportunidade de apresentar um pouco de diversidade nos Quatro Cantos, entretanto o que encontrei foi exatamente o contrário, literalmente. Já chego lá.
Suas primeiras andanças são devido a procura por um mecenas e chega em Vintas para se apresentar ao Maer, líder da região. Temos o mesmo joguinho político já tão aludido e presente no setting da Universidade com um ou outro fator diferente e é isso.
Temos o encontro com Feluriana, em que Kvoethe fica no mundo dos Encantados e aprende um pouco sobre eles e conversa com Cthaeh. O ar místico deste trecho do livro talvez seja a melhor passagem, já que contém elementos que são importantes pro plot principal.
Uma das viagens de Kvoethe, agora enviado pelo Maer para se livrar de alguns bandidos faz com que ele lidere um grupo de mercenários, um deles, um Ademriano. O que eventualmente leva o protagonista a conhecer esta cultura exótica.
Esse é o ponto em que minhas esperanças com o World-building do Sr. Rothfuss se esvaíram. Esta é a parte que quis dizer com ser “exatamente o contrário, literalmente”. E, ao mesmo tempo, é mais do mesmo. O povo Ademriano possui uma cultura extremamente diferente e interessante, a primeiro relance, até que me dei conta que ela parecia ser montada para ser o exato oposto do Kvoethe.
Kvoethe é um ótimo ator e encena bem, os Ademrianos acham sorrisos e expressões faciais de extrema intimidade e deve-se controlar tais impulsos e exibir seus sentimentos por gestos com as mãos. Kvoethe é músico,mas a música, para os Ademrianos é considerada mais íntima ainda e uma pessoa que toca para um público sem esconder seu rosto é considerado um prostituto.Kvoethe é um arcano poderoso, entretanto um guerreiro fraco. Os Ademrianos, por outro lado, são guerreiros natos e invencíveis num combate. Kvoethe era virgem até pouco antes de conhecê-los, tem problemas com mulheres, vive numa sociedade medieval extremamente machista. Os Ademrianos não tem taboos de nudez e sexo e vivem numa sociedade extremamente feminista.
E assim continua. Não é criativo. Se “O Temor do Sábio” é uma coletânea de episódios, o tempo nas terras de Ademre é o capítulo do dia do contra, do Bob Esponja. Quanto a parte de “ser mais do mesmo”, os Ademrianos são basicamente os elfos. Não estou dizendo quanto ao contato a natureza e orelhas pontudas, mas aquele sentimento que sempre paira em histórias envolvendo elfos, em que você não deve discutir comeles. Os Ademrianos são melhores em tudo, constroem casas sem formas padrão porque as deles complementam a natureza e são mais eficientes, seguem a Lethani, uma filosofia de vida que é tão complexa que uma de suas principais características é a impossibilidade de explicá-la, apesar de parecem um povo voltado ao treinamento como guerreiros, possuem tecnologias relativamente avançadas, são vítimas do que se resume ser uma diáspora e vivem em um dos piores pedaços de terra dos Quatro Cantos e ainda são prósperos. Consideram todos aqueles fora de sua cultura como “bárbaros”, o que não é problema, até o momento em que Kvoethe, o genial arcanista da Universidade, tem seus argumentos totalmente humilhados em qualquer discussão com eles. É frustrante.
Por fim, Kvoethe. Temos a versão ‘Kote’, do presente, que está contando a história. Um homem que está esperando a morte e que se diz ser a razão para a guerra que está acontecendo. A todo momento, o livro brinca com a ideia de ambuigidade moral do nosso protagonista. E, Kvoethe, o jovem aventureiro, com certeza flerta com essas ideias. Ele comete atos cruéis e totalmente psicóticos no dercorrer do livro, porém, sempre surge um fato, durante ou depois do acontecido, para atenuar sua culpa e não tirar nossa dúvida de que ele vive num mundo de moralidade cinza, mas com certeza é um cinza claro.
O que quero dizer é que não se toma nenhum risco com o personagem do Kvoethe. O eterno estado de pobreza em que se encontra é remediado, sua crueldade excessiva é descarregada em ladrões, impostores, assassinos, estupradores e que estão relacionados com o passado do protagonista. (Não estou falando de personagens avulsos e sim de personagens que são tudo isto ao mesmo tempo.). Isto não muda as atitudes do Kvoethe, porém com certeza força os leitores a se manterem do seu lado.
Por se tratar de um livro de aventuras que parecem avulsas, também não possui começo, meio e fim. É até engraçado, o final do livro trata-se do Kvoethe voltando ao que parece ser o plot principal da trilogia, deixando pra trás cerca de 500 páginas do que eu posso considerar ‘sidequests’.
Agora só resta a esperança que a pacing desregulada já montada pro último livro da trilogia (ainda sem nome) não seja suficiente e que a melhoria do Sr. Rothfuss em uma história coerente seja aproveitada para que essa série tenha um desfecho digno de fantasia épica, como tanto alardeiam.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Era Uma Vez, Há Muito Tempo Atrás, Brigid Pasulka



Era Uma Vez, Há Muito Tempo Atrás...
Brigid Pasulka

A primeira vez que ouvi falar desse livro foi em um dos milhares blogs de resenha que acompanho. E o que mais me deixou curiosa foi a mistura de conto de fadas com Polônia pré e pós guerra com a qual a história foi descrita.

São duas histórias intercaladas, é a história de uma família.

A princípio, o livro narra a história de Pombo e Anielica e de como se conheceram e se apaixonaram, todas as etapas do relacionamento, desde como Pombo cortejou o Anjo da Aldeia e como a invasão da Polônia pelas tropas alemães (o que daria início a 2ª Guerra Mundial) moldou suas vidas. Durante os primeiros capítulos, tem-se sempre a sensação de que os alemães vão chegar a qualquer momento e, então, quando o sofrimento vai chegar? É interessante como se tem vários livros que contam a história dos que foram diretamente atingidos, mas poucos sobre os que estavam sempre na expectativa de algo acontecer
.
E, logo em seguida, “começa” a história de Beata, neta de Pombo e Anielica, 50 anos depois. Beata, ao contrário dos avós, vive um momento de aparente tranqüilidade, tendo a Polônia se separado da URSS e adotado um sistema capitalista, ela tenta se adaptar a  sua nova vida em Cracóvia e, pouco a pouco, descobre a verdadeira Cracóvia por trás das história românticas contadas pela avó.


“Eu me pergunto quanta mudança somos capazes de aceitar na vida.”
p.335


Eu sempre tive muita curiosidade na maneira como um país como Polônia, Rússia, Alemanha, lidam com todas as guerras pelas quais passaram. Para mim, a II Guerra Mundial, a Guerra Fria... são apenas capítulos em um livro de história. Para eles, é algo que aconteceu a poucas décadas atrás. Ainda existem pessoas que passaram por todo o drama e o sofrimento daquela época, então, como lidar com isso?  E é isso o que mais me surpreende. Por causa da escolha das histórias, em um momento você está lendo sobre como foi a resistência polonesa à invasão alemã, a adaptação ao comunismo e, logo depois, como é sobreviver na Nova Polônia, como é ser jovem em um país cínico e desiludido, mas ao mesmo tempo batalhador

Achei um livro adorável, um conto de fadas de verdade... onde finais não são necessariamente felizes ou tristes.. ou sequer são finais. Uma história de solidariedade e de amor. Achei incrível como Brigid Pasulka levou a história dessas pessoas, submetidas ao trágico curso da história, de uma maneira tão suave. Do tipo que arranca lágrimas.


“Mas essa não é só uma história triste. É nosso passado. Sem isso, não temos nada.”
p.51



 P.S.: O tradutor poderia ter maneirado no uso de termos em polonês. Tentar lembrar o significado das palavras polonesas que você traduziu no Google Translate não é sempre divertido. :P