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terça-feira, 24 de julho de 2012

O Temor do Sábio - Patrick Rothfuss

 
Detalhes do livro:
Nome original: The Wise Man's Fear.           
Tradução: O Temor do Sábio.
Autor: Patrick Rothfuss. 
Lançamento: Original: 2011. (Março)
                       Em português: 2011.  (Novembro)
Páginas: Versão "Hardcover" original: 994.
                Versão em português: 960.   



[ATENÇÃO: ESTA “RESENHA” CONTÉM PEQUENOS SPOILERS, COMO NOMES DE PERSONAGENS E ALGUNS ACONTECIMENTOS FUTUROS NA TRAMA.]
 
“O Temor do Sábio”, segundo livro das crônicas do Matador do Rei (por que não Regicida?), continuação direta de “O Nome do Vento”, livro da minha resenha anterior.
Antes de começar os pormenores, acho cabível dizer que achei “O Temor do Sábio” uma leitura inferior comparado ao seu antecessor.  O que não quer dizer que não houve melhorias do primeiro para o segundo, só que os fatores que pioraram com certeza são mais expressivos.
O Sr. Rothfuss parece ter retroativamente ouvido algumas das minhas reclamações e fez mudanças de acordo como, por exemplo, a caracterização, ponto que frisei bastante na última resenha. Os personagens do ambiente da Universidade estão um pouquinho mais complexos e profundos. Talvez pela sua simples aparição e permanência do livro, dando-lhes situações diferentes para que possam reagir e para os leitores absorverem um poucos mais de suas personalidades. Aquele grande resumo da última resenha ainda se aplica, e aquelas características ainda descrevem os personagens com razoável margem de segurança, mas não é mais aquele festival de uni-dimensionalidade de antes. Caso eu tampe o nome dos personagens e leia seus diálogos, talvez agora consiga reconhecer quem fala o quê sem ter que recorrer a seus estereótipos.
Essa melhora na caracterização nos é recompensada com eles sendo retirados da trama da segunda metade do livro, quando Kvoethe larga a Universidade por alguns períodos para andar pelo mundo devido a desavenças com seu rival, Ambrose.
Os novos personagens novamente não se mostram tão simples quanto os do livro anterior pareceram, mas o processo de torna cansativo. Talvez meu maior problema com o livro seja esse. O processo. É difícil explicar. O livro é como se fosse uma grande série televisiva com seus inúmeros episódios. Existem aqueles episódios importantes pra trama e pro MythArc em geral e tem aqueles que são aventuras avulsas. O livro, principalmente sua segunda metade, parece uma grande coletânea desse segundo tipo de episódios. Kvoethe faz algo legal ali, faz mais algo acolá. Kvoethe conhece personagens novos, tem aventuras com eles por cerca de 100 páginas e depois eles não aparecem mais e ele vai pra outra região do mapa com novos personagens e novas aventuras. Nenhum desses personagens tem tempo razoável para sua caracterização e duvido que todos eles terão importância futura.
O problema principal é que são esses seus feitos avulsos os de maior importância no livro. Sim, não vou negar que tem algo importante ali no meio, sem querer dar muitos spoilers, o encontro com Feluriana parece que terá repercussões. Mas da grande Badass Boast que Kvoethe dá no começo de O Nome do Vento, só presenciamos até agora, um ou dois feitos relevantes (sendo o encontro com Feluriana um desses.).  O que me deixa apreensivo para o próximo livro, ele pode acabar contrastando demais com a pacing do resto da trilogia.
O fato de “nada acontecer” é o erro mais gritante de pacing. Lemos quase mil páginas e não tem nenhum prêmio no fim do caminho. Novamente não há antagonista palpável, apesar do livro introduzir mais um deles, na forma de Cthaeh. A premissa até é interessante, é um ser selado em uma árvore que vive no mundo dos Encantados (quase Exdeath) e pode ver o futuro. Não se preocupem, estou guardando os detalhes mais relevantes, porém tomem nota que o personagem não é explorado, assim como todos os outros antigos antagonistas.
Ambrose, rival do protagonista, cresce no status de rival ao começar a cortejar Denna, amada de Kvoethe. Entratanto, ele desaparece na metade do livro devido ao afastamento de Kvoethe da Universidade.
O Chandriano é mencionado em conversas entre personagens, é conseguida um pouco mais de informações sobre eles, porém sua real presença é reduzida a um cameo. Então, temos dois antagonistas (sendo um deles um grupo de 7 pessoas) pouco trabalhados e outro recém-introduzido na história sem nenhuma previsão de resolução, casa haja uma. Ou, na falta de resolução, pelo menos o andamento do plot.
Temos um melhor insight na arte da Nomeação agora que Kvoethe encontra-se sob a tutela de Elodin, o excêntrico professor e Nomeador-mor. Ainda não cheguei a uma conclusão se o Sr. Rothfuss às vezes força demais a barra para tornar Elodin o típico professor louco-porém-genial.
            O fato de Kvoethe resolver andar pelo mundo na segunda metade do livro pareceu uma boa oportunidade de apresentar um pouco de diversidade nos Quatro Cantos, entretanto o que encontrei foi exatamente o contrário, literalmente. Já chego lá.
Suas primeiras andanças são devido a procura por um mecenas e chega em Vintas para se apresentar ao Maer, líder da região. Temos o mesmo joguinho político já tão aludido e presente no setting da Universidade com um ou outro fator diferente e é isso.
Temos o encontro com Feluriana, em que Kvoethe fica no mundo dos Encantados e aprende um pouco sobre eles e conversa com Cthaeh. O ar místico deste trecho do livro talvez seja a melhor passagem, já que contém elementos que são importantes pro plot principal.
Uma das viagens de Kvoethe, agora enviado pelo Maer para se livrar de alguns bandidos faz com que ele lidere um grupo de mercenários, um deles, um Ademriano. O que eventualmente leva o protagonista a conhecer esta cultura exótica.
Esse é o ponto em que minhas esperanças com o World-building do Sr. Rothfuss se esvaíram. Esta é a parte que quis dizer com ser “exatamente o contrário, literalmente”. E, ao mesmo tempo, é mais do mesmo. O povo Ademriano possui uma cultura extremamente diferente e interessante, a primeiro relance, até que me dei conta que ela parecia ser montada para ser o exato oposto do Kvoethe.
Kvoethe é um ótimo ator e encena bem, os Ademrianos acham sorrisos e expressões faciais de extrema intimidade e deve-se controlar tais impulsos e exibir seus sentimentos por gestos com as mãos. Kvoethe é músico,mas a música, para os Ademrianos é considerada mais íntima ainda e uma pessoa que toca para um público sem esconder seu rosto é considerado um prostituto.Kvoethe é um arcano poderoso, entretanto um guerreiro fraco. Os Ademrianos, por outro lado, são guerreiros natos e invencíveis num combate. Kvoethe era virgem até pouco antes de conhecê-los, tem problemas com mulheres, vive numa sociedade medieval extremamente machista. Os Ademrianos não tem taboos de nudez e sexo e vivem numa sociedade extremamente feminista.
E assim continua. Não é criativo. Se “O Temor do Sábio” é uma coletânea de episódios, o tempo nas terras de Ademre é o capítulo do dia do contra, do Bob Esponja. Quanto a parte de “ser mais do mesmo”, os Ademrianos são basicamente os elfos. Não estou dizendo quanto ao contato a natureza e orelhas pontudas, mas aquele sentimento que sempre paira em histórias envolvendo elfos, em que você não deve discutir comeles. Os Ademrianos são melhores em tudo, constroem casas sem formas padrão porque as deles complementam a natureza e são mais eficientes, seguem a Lethani, uma filosofia de vida que é tão complexa que uma de suas principais características é a impossibilidade de explicá-la, apesar de parecem um povo voltado ao treinamento como guerreiros, possuem tecnologias relativamente avançadas, são vítimas do que se resume ser uma diáspora e vivem em um dos piores pedaços de terra dos Quatro Cantos e ainda são prósperos. Consideram todos aqueles fora de sua cultura como “bárbaros”, o que não é problema, até o momento em que Kvoethe, o genial arcanista da Universidade, tem seus argumentos totalmente humilhados em qualquer discussão com eles. É frustrante.
Por fim, Kvoethe. Temos a versão ‘Kote’, do presente, que está contando a história. Um homem que está esperando a morte e que se diz ser a razão para a guerra que está acontecendo. A todo momento, o livro brinca com a ideia de ambuigidade moral do nosso protagonista. E, Kvoethe, o jovem aventureiro, com certeza flerta com essas ideias. Ele comete atos cruéis e totalmente psicóticos no dercorrer do livro, porém, sempre surge um fato, durante ou depois do acontecido, para atenuar sua culpa e não tirar nossa dúvida de que ele vive num mundo de moralidade cinza, mas com certeza é um cinza claro.
O que quero dizer é que não se toma nenhum risco com o personagem do Kvoethe. O eterno estado de pobreza em que se encontra é remediado, sua crueldade excessiva é descarregada em ladrões, impostores, assassinos, estupradores e que estão relacionados com o passado do protagonista. (Não estou falando de personagens avulsos e sim de personagens que são tudo isto ao mesmo tempo.). Isto não muda as atitudes do Kvoethe, porém com certeza força os leitores a se manterem do seu lado.
Por se tratar de um livro de aventuras que parecem avulsas, também não possui começo, meio e fim. É até engraçado, o final do livro trata-se do Kvoethe voltando ao que parece ser o plot principal da trilogia, deixando pra trás cerca de 500 páginas do que eu posso considerar ‘sidequests’.
Agora só resta a esperança que a pacing desregulada já montada pro último livro da trilogia (ainda sem nome) não seja suficiente e que a melhoria do Sr. Rothfuss em uma história coerente seja aproveitada para que essa série tenha um desfecho digno de fantasia épica, como tanto alardeiam.

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